RENATO LAGE |
Maldito bicho, se me ouviu Se não gostou do meu samba Vai pra longe do Brasil Okolofé mamãe Kolofé-lorum Aieieu, aieieu mamãe oxum Vem, meu bem, vem, meu bem Sentir o meu astral, que legal Hoje estou cheio de desejo Quero te cobrir de beijos, etecetera e tal A vira virou, vira virou A Mocidade chegou Virando nas viradas dessa vida Um elo, uma canção de amor É no chuê chuê É no chuê chuá Não quero nem saber As águas vão rolar Estrela de luz Que me conduz Estrela que me faz sonhar Villa-Lobos é prova de brasilidade Sua obra altaneira Vem na voz da Mocidade Cantando a apoteose brasileira Salgueiro, vermelho Balança o coração da gente Guerreiro, é de bambas um celeiro Apenas uma escola diferente |
Paulo Renato Lage começou seu ofício artístico fazendo de tudo um pouco. Mostrou claramente que se virava fazendo bicos por aí, sem auxílio de ninguém para sobreviver. Foi chamado uma vez para trabalhar em estúdios de televisão como cenógrafo. Mas como a renda obtida não era suficiente, ele continuava fazendo outras coisas para conseguir algum dinheiro extra, como charges para jornais. Pouco tempo depois, foi se aprofundando mais, fazendo cursos para implementar seu trabalho até ser chamado para trabalhar na TVE do Rio de Janeiro, onde conheceu o mestre Fernando Pamplona. O então carnavalesco do Salgueiro pediu ao Renato para fazer alguns desenhos para decoração de alegorias. Pamplona gostou tanto do trabalho feito pelo cenógrafo, que o chamou para integrar parte de sua equipe na Academia do Samba. Começa ali sua trajetória no carnaval. Em 1977, foi criando partes das alegorias para o desfile do Salgueiro, com o enredo Do Cauim ao Efó, Moça Branca, Branquinha. Falava da história da culinária brasileira, citando vários tipos de alimentos existentes em nosso país do Oiapoque ao Chuí. Essa era a nova equipe de Pamplona, na qual o Renato e outros nomes integravam. Nova porque depois de sua saída do Salgueiro em 1972, nomes como Joãosinho Trinta, Arlindo Rodrigues, Rosa Magalhães e Maria Augusta foram deixando a escola da Tijuca e alcançando a hegemonia em outras escolas. Lage fazia parte da nova geração de carnavalescos que Fernando Pamplona voltava a lançar naquele seu retorno ao Salgueiro. O desfile do Salgueiro de 77 foi belíssimo, batendo diretamente com as ferozes Beija-Flor, Portela e União da Ilha. Um quarto lugar foi muito justo, principalmente para o nível do trabalho apresentado. Em 1978, Renato continuou na equipe de Fernando Pamplona no Salgueiro. O enredo, que seria sobre a história das escolas de samba, foi modificado. Tornou-se o mesmo de Joãosinho Trinta na Beija-Flor, justamente para tentar barrar o possibilíssimo tricampeonato da escola de Nilópolis. Acontece que desde a saída de Joãosinho Trinta e outros inúmeros integrantes da Academia em 1975, a agremiação tijucana ia mal das pernas, com problemas financeiros e brigas internas. O próprio Lage citou uma vez numa entrevista que houve casos de pessoas destruindo ocultamente seus adereços só como revolta. A escola fez um desfile bonito, mas os vários problemas fez a escola quase ser rebaixada. Ficou em sexto lugar, uma vez que o descenso era feito a partir da sétima colocação. Depois daquele carnaval, Fernando Pamplona abandou no a profissão de carnavalesco e sua equipe se desmoronou. Lage e seus companheiros estavam momentaneamente desempregados. O seu belo trabalho feito no Salgueiro foi suficiente para logo ser atraído por ofertas de outras escolas. Paulo César Cardoso (carnavalesco do futuro “Kizomba”) convidou Renato para confeccionar o desfile da Unidos da Tijuca para 1979, pois tinha uma ala sua lá. O carnavalesco tinha uma bomba em suas mãos: a escola do Borel estava no Grupo 2A (terceiro grupo), tinha uma exagerada falta de recursos e não era possuidora de chão suficiente para crescer muito. A falta de verbas era bem maior que a crise do Salgueiro. Mas Renato Lage tentou fazer o que podia. A escola do Borel já tinha um enredo para 79, que era “Brasil, canta e dança”. Com a ajuda do carnavalesco Geraldo Sobreira, o desfile deu muito certo e a Unidos da Tijuca subiu de grupo, ficando em 3º lugar. Já no Grupo 1B, Lage tentou realizar um sonho: ver a Tijuca voltar ao primeiro grupo. Escolheu cearense Delmiro Gouveia como enredo e investiu o máximo que podia em seu desfile para ver a escola ser campeão do acesso. E o sonho deu certo! A Unidos da Tijuca fez um desfile imprescindível e sagrou-se campeã. Um dos momentos mais marcantes foi a impecável alegoria que finalizava o desfile, representando a morte de Delmiro Gouveia. Renato colocou metais atrás do carro, que, quando friccionados, faziam barulho de cachoeira, gerando um impacto muito grande. Como curiosidade, vale a pena constar a vinda do então diretor de harmonia da Beija-Flor Laíla para a escola. A Beija-Flor também emprestou Neguinho para ajudar a puxar o samba na avenida. No ano seguinte, a escola optou por um enredo crítico, baseado no livro “Manuscrito holandês” de Manoel Cavalcanti Proença: “Macobeba, o que dá pra rir, dá pra chorar”. Tratava-se da luta de um cidadão simples (Mitavaí) contra a exploração das empresas multinacionais (o monstro Macobeba). Era um tema muito polêmico, pois a sobre do regime militar ainda pairava sobre o Brasil, ainda que menos forte que há dez anos antes. Embalada por um samba extraordinário, a Unidos da Tijuca foi impressionando a todos com um desfile fantástico. Uma das alegorias mais incríveis já apresentadas num desfile foi justamente o carro que representava o polvo Macobeba, feito todo em com copinhos de plástico e com os tentáculos agarrando vários produtos, incluindo duas TVs ligadas! Mesmo assim, a Tijuca convenceu todos com seu mágico desfile, menos os jurados, que injustamente ficou num reles 8º oitavo lugar. Pelo menos, não fora rebaixada! Em 1982, Lage optou por uma homenagem ao escritor Lima Barreto, que não teve tanto sucesso, levando a Tijuca ao 9º lugar. Renato sai da escola. Pouco depois, surgiu a proposta do então campeão Império Serrano para trabalhar no carnaval de 1983. Asaída das vitoriosas Lícia Lacerda e Rosa Magalhães foi uma oportunidade única para ele poder mostrar seu talento numa escola grande, como era o Império naquele momento. O enredo foi uma proposta de Fernando Pamplona, sobre as baianas. Falava da cultura, religião, culinária e sentimento de mãe das baianas. Logo de cara, o desfile de Império já fora apontado como bicampeão. Era um conjunto de fantasias e alegorias deslumbrantes, abordando com muita perfeição o enredo. Essa glorificação tem seus motivos, pois foi só aí que o carnavalesco teve a oportunidade de contar com algo que era difícil nas escolas em que passou antes: recursos financeiros. A escola da Serrinha ficou em 3º lugar, atrás da Portela e Beija-Flor. No ano seguinte, Renato novamente aposta num enredo de Fernando Pamplona e novamente, tem uma excelente colocação. Tratava-se de Foi malandro é, outro desfile incomensurável do Império, dando um vice-campeonato para o carnavalesco, sua melhor colocação até então. Em 1985, Lage decidiu fazer um desfile não proposto por Pamplona. Pela primeira vez, convidou a sua então esposa Lílian Rabelo. Os dois armaram um desfile sobre a cerveja, contando a história, produção e consumo da bebida no Brasil e no mundo. Foi um desfile inferior ao dos anos anteriores do Império, mas ainda sim tenha um impacto visual muito grande, super colorido com predominâncias de cores douradas nas fantasias e nos carros. Ironicamente, a escola da Serrinha ficou em sétimo lugar (que era uma posição ruim em comparação aos anos anteriores) justamente na estréia da Lílian como carnavalesca. Em 1986, o Império quis muito melhorar e o Renato novamente apostou num tema polêmico, comemorando o fim do regime militar. “Eu quero” era um enredo proclamando o direito do brasileiro à saúde, educação, segurança, alimentação, moradia e felicidade. Foi um desfile altamente tradicional, leve, delicado nos mínimos detalhes, mas jamais simplório. Se não fossem certos problemas de evolução, a escola haveria sido campeã. O casal ficou em 3º lugar e se despediu da escola depois do carnaval. No ano seguinte, Lage e sua esposa deram uma passada no Salgueiro, voltando ao lugar onde ele havia começado no carnaval dez anos antes. Apostou num belo enredo sobre a felicidade, realizando mais uma vez um desfile levíssimo no ápice da palavra. Houve muito bom gosto na confecção dos carros e fantasia, num colorido majestoso da agremiação. Um injusto 5º lugar não foi tão merecido pela escola, pois segundo os especialistas, a escola poderia ter obtido no mínimo uma 3ª colocação. O casal saiu da escola tijucana e foi convidada para fazer carnaval na Caprichosos de Pilares. Eles deram um basta na seqüência de temas críticos, que já estavam começando a afundar a escola. Renato optou por uma homenagem aos 90 anos do cinema. Mais uma vez, o casal esbanjou da beleza em seu desfile e a leveza (semelhante à de 1985 da escola) fez a Caprichosos tirar um belo 8º lugar, empatada com a Mocidade e a Tradição. Em 1989, a Caprichosos fora muito injustiçada, com um 12º lugar. Fez um desfile muito bonito, com o crítico enredo O que é bom todo mundo gosta, abusando de adereços bem-acabados e de um efeito bastante chamativo. Depois do carnaval de 89, Lage saiu da Caprichosos. Durante esses 11 anos trabalhando no carnaval carioca, Renato Lage alternou entre bons e maus momentos, porém nada se compararia aos 13 anos que viriam pela frente. Um nome marcou toda a sua carreira e esse nome era forte: Mocidade Independente de Padre Miguel. A escola de Arlindo Rodrigues e Fernando Pinto passava por maus momentos depois da morte do tupinicopolitano Fernando Pinto em 1987. Em 1988, a agremiação esteve sem a força tanto de seu patrono (o bicheiro Castor estava preso) e de seu mestre maior (como já disse, havia morrido). Foram dois anos de troca-troca de carnavalesco, até o Castor convidar o casal para fazer o carnaval de 1990. O enredo se chamava Vira, virou, a Mocidade chegou e falava dos 35 anos de história da agremiação da Vila Vintém. Era a história da escola desfilando, da bateria aos intérpretes, dos presidentes aos destaques, do. O desfile de 1990 foi dividido em quatro partes principais. A primeira falava dos primeiros anos de fundação e formação da escola. A segunda constava a década de 70, quando a escola começava a crescer com enredos do luxuoso Arlindo Rodrigues. A terceira fazia uma síntese dos enredos do tropicalista Fernando Pinto nos anos 80. A quarta era uma interrogação em relação ao futuro da escola na última década do milênio e depois. As mudanças de uma cada fase dessas para outra foram chamadas de “viradas” pelo Renato e pela Lílian (que estava grávida de sete meses na época). Daí veio o nome “Vira, virou” do enredo. Só para constar, os setores citados acima eram divididos por tripés com duas ampulhetas e um letreiro luminoso anunciando a década que seria citada a frente. O atual estilo high-tech do carnavalesco começou a dar as caras ali, na qual eles usaram e abusaram dos efeitos especiais, como o néon em inúmeros carros. Mas a comunicação com o público, embalado por um samba muito popular, mostrava que era desnecessário tanto investimento para abocanhar uma boa posição. O comovente retorno do bicheiro Castor de Andrade à avenida, que cumprimentou cada componente um a um, também foi algo marcante. Renato Lage foi campeão com méritos! Era impressionante ver como um carnavalesco chegava em uma nova escola e logo de cara arrancava um campeonato. O casal ficou na escola de Padre Miguel e escolheu um enredo sobre as águas para o carnaval de 1991. O nome era Chuê... Chuá... As águas vão rolar e a agremiação era uma das favoritas, pois tinha um samba melhor e mais popular até que o do ano anterior. E empolgadíssimos, foi o casal tentar o bicampeonato. Logo no começo do desfile, o público já aplaudia euforicamente. Essa passagem fantástica da Mocidade foi marcada pela inesquecível comissão de frente dos escafandristas, o abre-alas com a tradicional estrela da escola em forma de estrela-do-mar, a singular bateria fantasiada de mergulhadores, a alegoria representando a Arca de Noé e principalmente, o incomensurável carro representando o globo terrestre com feto dentro. A Mocidade chegou à apoteose sob os eufóricos gritos de “bicampeã”. E era o que viria acontecer na quarta-feira de cinzas. A agremiação da Vila Vintém ganhou não só o Estandarte de Ouro de melhor escola, como também seu primeiro (e único) bicampeonato. A profecia havia sido realizada! No ano seguinte, a Mocidade estava sendo o centro das atenções do carnaval. Dava a impressão que o desfile estava a frente de todos os outros, pois era uma expectativa tão grande que a escola parecia já ter levado o título de tricampeã. Novamente, vinha se superando cada vez mais, com um samba mais popular e melhor que dos anos anteriores. O desfile já havia sido começado com um quê de campeonato, pois a Mocidade mais uma vez tinha uma comunicação gigantesca com o público. O trabalho apresentado deslumbrante, num conjunto de alegorias e fantasias impecáveis. O enredo era interessantíssimo, falando dos diversos tipos de sonhos, dos sonhos noturnos aos desejos eróticos, dos delírios infantis às outras dimensões. Um dos melhores desfiles do ano, porém o sonho do tri seria adiado. O casal teve o azar de competir com o imbatível desfile da Estácio de Sá, com um maravilhoso enredo sobre os 70 anos do modernismo no Brasil. A Mocidade ficou por 1,5 pontos de faturar o título, mas era difícil barrar o trabalho maravilhoso de Chico Spinoza, Mário Monteiro e Paulo Barros. Depois do carnaval de 1992, Lílian havia desfeito seu casamento com Renato, deixando assim de ser sua companheira de trabalho e, por conseguinte, carnavalesca da Mocidade. Mas seu ex-marido continuou na escola da Vila Vintém e decidiu fazer um enredo sobre os inúmeros tipos de jogos. Em 1993, a escola mais uma vez veio como uma das favoritas, apesar de entrar meio sem-jeito na Sapucaí depois da tristeza do vice de 92. A agremiação fez um desfile mediano em relação aos anos anteriores, mas muito bem elaborado com um belíssimo conjunto de fantasias e alegorias. Um dos maiores impactos daquele desfile foi o carro representando os games eletrônicos com uma célebre escultura de garoto jogando num joystick e o último carro, onde eram caracterizados o jogo do bem e o mal. Foi um desfile muito bem-feito, mas era dificílimo deter o “efeito Ita” do Salgueiro. Em maio de 1993, a escola foi abalada por um grava acontecimento, que foi a prisão do bicheiro Castor de Andrade. A Mocidade havia ficado com pouca verba para o desfile seguinte e sofreu muito com isso, ameaçando até não desfilar em 1994. Renato teve a oportunidade de escolher se queria sair ou não da escola. Preferiu então ficar e tentar fazer a escola brigar por uma boa colocação. Escolheu como enredo a Avenida Brasil, que é a mais importante via de entrada e saída do Rio de Janeiro. Tentou usar o máximo a criatividade, pois sabia que não podia investir tanto no luxo. Mesmo assim, a agremiação realizou um desfile pobre, com um samba mediano e uma evolução que não agradou muito os jurados. Mesmo tirando todas as notas máximas no quesito alegorias e adereços (um dos poucos pontos fortes da escola), Lage acabou em 8º lugar, sua pior colocação na Mocidade. Em 1995, a escola voltou a brigar por uma boa colocação. O belíssimo enredo Padre Miguel, Olhai por Nós falava da fé e da religiosidade dos brasileiros. Citava toda história das crenças em nosso país e também os perigos existentes no mundo das religiões no Brasil. E foi notável que o clamor do título do enredo deu certo, pois Padre Miguel realmente olhou pela escola, que havia passado por uma situação difícil no ano anterior e em 95, ela arrebentou na avenida. Acontece que Renato Lage sobe muito bem reconhecer os erros que a Mocidade cometeu em 94. Decidiu fazer uma reavaliação de seu estilo apresentado a cada ano e notou que o principal erro de 1994 foi o exagero de futurismo e a falta de emoção. Daí o carnavalesco armou um desfile elegante, mas simples, tradicional, sem o abuso de efeitos especiais e tecnologias high-tech, até porque a Mocidade ainda estava numa crise financeira. Um 4º lugar foi muito merecido para o nível de exuberância apresentada. Depois do desfile, Renato ameaçou a querer deixar a escola. Porém o patrono Castor insistiu muito para o carnavalesco ficar, alegando que seu sonho do tricampeonato ainda não havia sido realizado. Renato decidiu ficar na Mocidade. Estranhamente, o carnavalesco voltou a fazer um desfile high-tech para o carnaval de 1996, esbanjando do néon e das exuberantes tecnologias. O enredo se chamava Criador e criatura e citava as inúmeras criações já feitas, tanto de Deus quanto dos homens. Mas quando estava próximo do desfile da Mocidade, houve um desastre! Durante o desfile da Portela, várias alegorias começaram a quebrar na dispersão, ficando amontoados por lá durante muito tempo. Depois, veio a Viradouro de Joãosinho Trinta e como as alegorias portelenses estavam presas na dispersão, os carros da Viradouro também ficaram presos, causando um verdadeiro engarrafamento de alegorias. Essa ocorrência fez a Liesa adiar o desfile da Mocidade, o que irritou em muito o carnavalesco. Renato alegava que seu desfile foi feito para noite e todo seu investimento poderia vir por água abaixo se o dia clarear. Mas assim foi e às cinco horas da manhã, começou o desfile da Mocidade, que estava previsto para as duas e meia da noite. Logo de cara, o público soltou o típico grito de “É campeã” para tamanha beleza do abre-alas. Chamou a atenção a singular comissão de frente representada por vários Frankensteins, comandados pelo ator César Macedo. Foi seguida pelo setor que representava a criação do mundo, com fantasias belamente multicoloridas. Foi falando da criação da natureza, com um excepcional carro “Elementos da Natureza”, com um imenso aquário de placas de acrílico. Depois, começou a citar os seres humanos e suas inúmeras invenções, do parafuso ao computador, do chip ao foguete. A cada ala que passava, mais o enredo se tornava interessante. Para finalizar o desfile, Renato deixou uma mensagem de otimismo, transformando a triste imagem da bomba de Hiroshima em uma alegoria rodeada de flores e pássaros. Foi um desfile fantástico, feito para todo público aplaudir. Este desfile foi capaz de dar ao Lage e a Mocidade seus últimos campeonatos da história até então, superando até a Imperatriz de Rosa Magalhães. Em 1997, a escola mais uma vez veio como favorita ao bicampeonato. O enredo De corpo e alma na avenida falava da saúde e citava as inúmeras partes do corpo humano. Novamente, a Mocidade começou e terminou seu desfile muito aplaudida pelo público e elogiada pelos críticos. A começar pela interessantíssima comissão de frente fazendo uma alusão ao surgimento do homem como um ser aquático. Depois, veio o maravilhoso abre-alas representando a formação da vida, que teve problemas técnicos e acabou perdendo por alguns instantes toda sua iluminação de néon no começo do desfile. Obviamente, não foi algo tão comprometedor ao conjunto da escola. Essa alegoria foi seguida de uma seqüência belíssima de alas e carros, cada um ricamente confeccionado. O desfile fazia citações ao ato sexual, aos sistemas sanguíneos e digestivo, ao cérebro, ao esqueleto, aos cincos sentidos, a musculatura, aos atendimentos médicos e a morte. Foi outro desfile singular, luxuoso e multicolorido. Infelizmente, a Mocidade teve problemas sérios de harmonia, pois seu desfile estava quase completo antes do tempo mínimo de desfile se completar (65 minutos). Isso obrigou os componentes da escola ficarem evoluindo em frente a dispersão até chegar os 65 minutos de desfile. E na apuração, não deu outra! A Mocidade havia perdido por 0,5 ponto em harmonia para Viradouro, que no ano anterior havia ficado em 13º lugar. O sonho do tricampeonato havia sido adiado mais uma vez. Durante o ano de 97, o patrono Castor de Andrade vem a falecer. Em 1998, Renato Lage prepara um desfile altamente futurista. Mesmo sabendo dos problemas financeiros que a Mocidade enfrentava, ele desfrutou em muito de seu estilo high-tech. A escola teve o abusivo uso de fantasias e alegorias luxuosas, na qual era notável o esbanjamento de dinheiro nos mais mínimos detalhes. A Mocidade fez, em 98, um dos desfiles que mais honrou o título de high-tech ao carnavalesco. Mesmo assim, é inegável a criatividade do desfile feito. O enredo Brilha no céu a estrela que me faz sonhar, confundido primeiramente como uma homenagem ao falecido Castor de Andrade, era uma espécie de releitura do clássico enredo Ziriguidum 2001, pois falava de estrelas e corpos celestes. Falava não só do aspecto físico dos astros, como de toda folclore e mitologia que os envolve, como a astrologia. A Mocidade, pra variar, veio com uma qualidade de alegorias e fantasias irrepreensíveis, destacando o belíssimo e gigantesco sol de néon do abre-alas e o carro “Contatos imediatos”, representando discos voadores e extraterrestres, tendo Carla Perez como destaque. Mas todo o investimento do carnavalesco foi por água abaixo na quarta-feira de cinzas, quando os jurados colocaram a Mocidade apenas no 6º lugar. Lage novamente sofreu pelo seu estilo, o que o fez hesitar quanto o seu tão falado exagerado futurismo. Para o carnaval de 1999, Renato Lage escolheu o enredo Villa-Lobos e a apoteose brasileira, uma singela homenagem ao maestro carioca, que viajou o Brasil inteiro para compor suas obras. Mas o inesperado acontece: Paulo Renato Lage muda completamente seu estilo high-tech e prepara um desfile altamente tradicional! Até a iluminação deixou de ser o tão falado néon, transformando-se em pequenos efeitos de lâmpadas nos carros. O carnavalesco armou um desfile investindo muito nas folhagens artificiais e em esculturas de animais, até porque o enredo contribui muito com isso. Mas também tentou usar o estilo barroco, já que estavam falando de um músico erudito. Pode-se dizer que foi um desfile misturando o tropicalismo de Fernando Pinto com o clássico de Arlindo Rodrigues, dois nomes marcantes da história da escola. O desfile começou com uma seqüência de alas falando da Amazônia, seguidas das sempre maravilhosas baianas e de um impecável abre-alas tropical, citando o encantamento da Europa com as obras de Villa-Lobos trazidas para lá. Logo após, Renato Lage teve a corajosa idéia de trazer uma orquestra de violoncelos, tendo como destaque o ator Marcos Palmeiras, representando o músico. Porém este carro teve sérios problemas ao entrar na avenida, pois demorou demais para colocar seus destaques em cima e, para piorar, acabou ficando preso na entrada do Sambódromo, deixando um imenso buraco em frente ao setor um. Mas isso não foi motivo para grandes preocupações e a alegoria foi muito aplaudida pelo público. Aos poucos, a Mocidade foi empolgando a todos, pois tinha um enredo belíssimo e uma comunicação extraordinária com o público, que se empolgava com cada carro ou ala que passava. Todo trabalho do carnavalesco foi genial, tendo infinitos ápices de genialidade. Terminou seu desfile aplaudida de pé por todo público do Sambódromo, faturando inclusive um Estandarte de Ouro de melhor escola. No dia da apuração, infelizmente houve muitas lágrimas. O jurado Carlos Pousa notou o buraco no início do desfile e teve a coragem de lascar um 7,5 em harmonia. Isso fez a Mocidade ficar em 4º lugar, perdendo para um desfile frio e insosso da Imperatriz. No ano da virada do milênio, Renato escolheu o enredo Verde, amarelo, branco e anil irão colorir o Brasil do ano 2000 e prometia vingança em relação ao sacrilégio de 1999. O carnaval daquele ano era monotemático, comemorando os 500 anos de descobrimento do Brasil, e o Renato decidiu falar das quatro cores de nossa bandeira. “Para variar,” a Mocidade fez um desfile extraordinário, começando com uma belíssima nave espacial carregando os “índios do futuro”. O que mais impressionava naquele desfile foi a organização das cores da bandeira brasileira em cada setor da escola. O verde foi representado por um carro lembrando a Amazônia como o “pulmão do mundo” e por uma encantadora floresta, repletas de índios, animais e mistérios. O amarelo foi representado por um gigantesco troféu dourado, lembrando os nossos grandes nomes esportivos. O azul foi representado por uma belíssima alegoria trazendo seres marinhos, lembrando as água. Desfile terminou com um infindável manto branco, simbolizando uma mensagem paz, o que seria um prenuncio ao desfile de 2001. A combinação de cores da escola foi uma das mais impactantes da história e novamente, Renato brigou duramente por um campeonato. Infelizmente, isso não veio acontecer de novo, pois a Mocidade acabou de novo num injusto 4º lugar. Em 2001, Renato Lage fez um enredo sobre a paz e decidiu chamar sua nova esposa, Márcia Lávia, para ajudar a confeccionar o desfile. Comicamente, a Mocidade foi mal em 2001, ficando em 7º lugar justamente na estréia de sua mulher. O engraçado era que o Império também foi muito mal quando a Lílian estreiou ao seu lado em 1985, ficando também na sétima colocação. Para o ano seguinte, o casal decidiu caprichar. O enredo iria ser sobre a aviação, mas o Renato decidiu trocar ao ver que o Salgueiro e a Beija-Flor também abordariam esse tema. Decidiram falar do sentimento de magia e surpresa das pessoas em relação ao mundo mágico do circo. O carnavalesco e sua esposa investiram muito naquele carnaval, tentando fazer de tudo para a Mocidade caprichar. Foram um dos últimos grandes desfiles da história da escola, o melhor do novo século. Todas as maravilhas do circo foram lembradas, numa seqüência mágica de alegorias e fantasias, deixando todo público com a sensação de estar assistindo um espetáculo circense. Um desfile fantástico, que rendeu a agremiação outro amaldiçoado 4º lugar. No ano seguinte, o Salgueiro faria aniversário de 50 anos, mais precisamente, no dia da apuração de 2003. O então presidente da agremiação tijucana decidiu levar o casal para lá, depois de uma seqüência de más colocações em carnavais anteriores. O Salgueiro insistiu tanto que os carnavalescos aceitaram. Foram nada mais que 13 anos seguidos na Mocidade Independente, maçados por três campeonatos e dois vices, além de outros desfiles inesquecíveis. Renato Lage deixou sua marca na escola da Vila Vintém, mas sentiu que precisavam dar uma renovada e saíram da Mocidade. Porém isso não seria motivo para saírem brigados e ainda hoje possuem muitos amigos na escola. O enredo salgueirense de 2003 se chamaria Salgueiro, minha paixão, minha raiz – 50 anos de glória e narrava toda história da agremiação. O Salgueiro era já cotado como campeão antes mesmo do carnaval. A escola possuía fantasias e alegorias consideradas as melhores do ano. Entrou na avenida com garra, sabendo que aquele ano era para marcar o novo milênio e apostou muito no trabalho dos carnavalescos. O abre-alas lembrava o morro em que o Salgueiro foi fundado e trazia inúmeros baluartes do samba, até de outras escolas de samba. Daí, seguiram-se os tripés, alegorias e alas lembrando os oitos títulos de história da escola. O Renato e a Márcia investiram muito num acabamento de extrema qualidade e em fazer que todos que assistissem aquele desfile entendessem a mensagem passada. Mas o Salgueiro acabou ficando grande demais e seria muito difícil fazer toda a escola passar no tempo limite. A escola acabou tendo problemas nesse quesito e perdeu 0,8 décimos por quatro minutos de atraso. Mesmo com um dos melhores desfiles do ano, ganhador do Estandarte de Ouro, o Salgueiro ficou apenas em 7º lugar. Em 2004, o casal decidiu continuar na escola tijucana. Armou um enredo didático, defendendo o uso do álcool como combustível. O Salgueiro fez um desfile bonito, leve, confiando menos no afoito campeonato. Uma das imagens que mais ficaram daquele carnaval foi a comissão de frente (que num de seus movimentos, imitava um elefante) e o último carro “Alcóopolis”, uma cidade fictícia que usava apenas o álcool como combustível, tendo direito até a karts de verdade transitando pela alegoria. O Salgueiro ficou em 6º lugar e, ao contrário do ano anterior, voltou ao desfile das campeãs com o maior pique. Para 2005, Renato decidiu abordar um tema oposto ao que havia trazido na Mocidade em 1991: o fogo. O casal preparou um desfile empolgante, feito para animar o público e agradar os jurados. O Salgueiro escolheu novamente uma marchinha oba-oba, o que era praticamente desnecessária em relação ao trabalho que seria apresentado. O desfile da agremiação foi algo divertido, criativo, que empolgou todos os espectadores com um verdadeiro espetáculo de inteligência. A escola trouxe uma seqüência de carros fantásticos e fantasias incrivelmente comunicativas. Mas o Salgueiro teve problemas com o tamanho das alegorias, pois várias delas acabaram ficando presas nas árvores da concentração e demoraram a entrar na avenida. Um dos carros até chegou a rachar uma das torres. Isso comprometeu um pouco a situação da escola, porém mesmo assim o Salgueiro ficou em 5º lugar, tendo seus méritos até hoje. Claramente, Renato Lage teve maus momentos durante sua trajetória, como a baixa colocação da Mocidade em 1994. Porém nada viria a se comparar ao desfile paupérrimo que o Salgueiro fez em 2006. O enredo era bem abstrato e chamava-se Microcosmos: o que os olhos não vêem, o coração sente. Foi um desfile claramente high-tech, cheio de efeitos especiais, mas chatíssimo, insosso, que não empolgou ninguém, nem o público da Sapucaí nem os expectadores de televisão. O fato de a escola ter aberto a noite dos desfiles também comprometeu a situação do Salgueiro, fazendo todos desacreditarem na força da agremiação. Na quarta-feira de cinzas, a escola teve a pior colocação de sua história: 11º lugar. Em 2007, Lage prometeu vingança. Escolheu um tema afro, exaltando as candaces, uma dinastia de rainhas guerreiras da África oriental. Antes mesmo do carnaval, o Salgueiro era aclamado como um dos mais impactantes conjuntos de alegorias e fantasias do novo milênio. O carnavalesco deixou o estilo futurista de lado para fazer um carnaval extremamente tradicional, lembrando seu trabalho na escola em 1978, sob o comando de Fernando Pamplona. O desfile foi aberto por um abre-alas gigantesco, mostrando uma feiticeira africana saindo de um baobá, representando a origem humana. Depois, foram surgindo os reinos das candaces, destacando-se o cortejo da Rainha de Sabá e o palácio luxuoso da rainha Nefertiti. Foi um desfile impecável do início ao fim, um trabalho tão exuberante que chegava a doer os olhos. Era algo imponderável, feito para jurado nenhum botar defeito. Mas o polêmico samba salgueirense acabou por ter problemas na avenida, o que prejudicou muito a harmonia da escola. As lágrimas reinaram após a apuração do carnaval, com o Salgueiro ficando apenas na 7ª posição. Para o carnaval de 2008, Renato Lage e Márcia Lávia escolheram o enredo O Rio de Janeiro continua sendo... Mais uma vez, o Salgueiro cotado como um dos favoritos do carnaval, já que traz um enredo bem interessante, principalmente por parte dos cariocas. Renato Lage é com certeza, um dos mais importantes carnavalescos da atualidade e tem o seu nome marcado na história do carnaval. |
HISTÓRICO: Começou no Salgueiro em 1977, como membro da equipe de Fernando Pamplona 1977 e 1978: Salgueiro 1979 a 1982: Unidos da Tijuca 1983 a 1986: Império Serrano 1987: Salgueiro 1988 e 1989: Caprichosos de Pilares 1990 a 2002: Mocidade 2003 até hoje: Salgueiro MARCA: Futurismo high-tech. Renato Lage sempre investiu muito em inúmeros efeitos especiais para enriquecer seus desfiles, principalmente no uso abusivo de néon nas alegorias. CAMPEONATOS: cinco ao todo, três no Primeiro Grupo e dois no Acesso: 1979 (Unidos da Tijuca no Grupo 2A, com Brasil, canta e dança), 1980 (Unidos da Tijuca no Grupo 1B, com Delmiro Gouveia), 1990 (Mocidade no Grupo Especial, com Vira, virou, a Mocidade chegou), 1991 (Mocidade no Grupo Especial, com Chuê... Chuá... As águas vão rolar) e 1996 (Mocidade no Grupo Especial, com Criador e criatura). VICES-CAMPEONATOS: 1984 (Império Serrano, com Foi malandro é), 1992 (Mocidade, com Sonha não custa nada! Ou quase nada...) e 1997 (Mocidade, com De corpo e alma na avenida) ESTANDARTES DE OURO: nove ao todo: 1981 (de enredo), 1991 (de melhor escola), 1995 (de enredo), 1996 (de enredo), 1999 (de melhor escola e enredo), 2002 (de personalidade), 2003 (de melhor escola) e 2006 (de enredo) PS: na contagem dos “Estandartes de Ouro”, foram incluídas também premiações que não envolve somente o carnavalesco, mas também a escola como um todo, como “Melhor escola” ou “Comunicação com o público” |
FOTOS DE RENATO Renato Lage, ao lado da sua então esposa Lílian Rabello no desfile campeão de 1990 e atualmente num animado ensaio do Salgueiro em 2007 com sua atual mulher, Márcia Lávia A revolta do carnavalesco contra a Liesa em 1996 em decorrência ao engarrafamento de alegorias |
DESFILES DO RENATO Desfile de Pamplona e Renato Lage no Salgueiro em 1977 e o monstro Macobeba atacando a pecuária em 1981 A exaltação às baianas de 1983, a homenagem aos malandro de 1984 e o sensacional “Eu Quero” de 1986 A trilogia Lílian-Renato na Mocidade, com o bi de 1990/1991 e o vice de 1992 O divertido desfile de 1993, a leveza de 1995 e campeonato futurista de 1996 O colorido vice de 1997 sobre o corpo humano e a alegoria high-tech “Contatos imediatos” de 1998 Os impecáveis 4º lugares de 1999, 2000 e 2002, alguns dos últimos do carnavalesco na Mocidade Os belíssimos desfiles do Renato no Salgueiro em 2003, 2005 e 2007 |
CARNAVAL 2012
TORCIDA ORGANIZADA RAIZ MANGUEIRENSE
sexta-feira, 25 de março de 2011
matéria:OS GRENDES CARNAVALESCOS DO CARNAVAL CARIOCA.
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