DESFILE DAS ESCOLAS DE SAMBA DO GRUPO ESPECIAL - CARNAVAL 97
Desde 1975, quando Joãosinho Trinta e Maria Augusta apresentaram no Salgueiro o enredo “O Segredo das Minas do Rei Salomão”, as grandes escolas de samba do Rio de Janeiro passaram a driblar o regulamento dos desfiles (que proibia temas internacionais) indo buscar em terras e culturas estrangeiras inspirações para seus carnavais. No entanto, o enredo tinha obrigatoriamente que ter uma ligação com o Brasil, algo que desafiava a imaginação dos carnavalescos, mas que fazia com que a brasilidade se mantivesse presente mesmo quando os temas “viajavam” pelo Egito de Cleópatra ou pelas areias do deserto do Saara. Para o desfile de 97 a LIESA, com a conivência da diretoria das escolas, decidiu liberar os temas internacionais e o resultado dessa decisão, pelo menos num primeiro momento, refletiu e continua refletindo negativamente na qualidade dos enredos, haja vista que essa abertura parece ser fruto de uma preocupação muito mais mercadológica do que cultural, o que é uma lástima.
Se por um lado a permissão de temas internacionais agradou a alguns carnavalescos, quase todos foram contrários a um dos itens do novo regulamento, que limitou em oito o número máximo de alegorias para cada agremiação. Tal decisão contribuiu ainda mais para a padronização dos desfiles e com um certo pragmatismo na estruturação dos enredos. Aliás, todo regulamento exagerado, embora vise um aperfeiçoamento do espetáculo, é um paradoxo ao espírito dionisíaco do carnaval.
Ainda citando o regulamento, ficou acertado, mais uma vez, que as quatro escolas piores colocadas seriam rebaixadas de grupo. Dezesseis escolas participaram dos desfiles de domingo e segunda-feira.
Se por um lado a permissão de temas internacionais agradou a alguns carnavalescos, quase todos foram contrários a um dos itens do novo regulamento, que limitou em oito o número máximo de alegorias para cada agremiação. Tal decisão contribuiu ainda mais para a padronização dos desfiles e com um certo pragmatismo na estruturação dos enredos. Aliás, todo regulamento exagerado, embora vise um aperfeiçoamento do espetáculo, é um paradoxo ao espírito dionisíaco do carnaval.
Ainda citando o regulamento, ficou acertado, mais uma vez, que as quatro escolas piores colocadas seriam rebaixadas de grupo. Dezesseis escolas participaram dos desfiles de domingo e segunda-feira.
As nações do mundo, representadas em um dos carros alegóricos da Rocinha
ACADÊMICOS DA ROCINHA – Com aproximadamente 2800 componentes e cercada de muita expectativa, a Rocinha abriu seu desfile exatamente na hora marcada: às 19h30. Como estávamos no horário de verão, a noite estava apenas começando a cair. Pela primeira vez no grupo principal, a escola de São Conrado optou por um tema que seria alvo de críticas ácidas durante todo o período pré-carnavalesco: “A Viagem Fantástica de Zé Carioca a Disney”. Confesso fazer parte da turma que torcia o nariz para o tema proposto, que, num primeiro momento, me pareceu ser muito mais um “folder” carnavalesco da Disney do que propriamente um enredo, mas eu tinha esperança que o carnavalesco Flávio Tavares tivesse a perspicácia de introduzir personagens da cultura brasileira dentro da viagem citada no título do tema, o que, infelizmente, não aconteceu. Desde a bem fantasiada comissão de frente, que apresentou borboletas estilizadas na fantasia “Asas da Imaginação”, até o último carro, ficou claro o compromisso da escola com os dólares que viriam da Flórida. Seguindo o abre-alas, que simbolizava a viagem do Zé Carioca a Disney, apareceram alas vestidas de borboletas, papagaios e flamingos. Aliás, a ala dos flamingos, aves típicas da Flórida, estava muito bonita. O Castelo da Cinderela surgiu no segundo carro, referente à inauguração do parque, em 1971. Seguiram-se alas com fantasias bem solucionadas e uma com vários componentes sem chapéu, o que não chegou a comprometer o conjunto, pois, de uma forma geral, a Rocinha apresentou bom acabamento nos figurinos. Aliás, os sapatos dos componentes também eram apropriados e bem cuidados, o que nem sempre acontece, mesmo em escolas grandes. A maioria das alegorias destinou-se a mostrar as atrações do parque, tais como a Montanha Russa Espacial, que apareceu no terceiro carro e o Epcot Center, representado por uma alegoria com problemas de acabamento. O penúltimo carro, denominado “Nações do Mundo”, foi um dos que eu mais gostei, mas achei as fantasias melhores que os elementos alegóricos, pois além de pequenos problemas de acabamento, as alegorias não conseguiram causar nenhum impacto. Esperava-se a tecnologia do parque a serviço da escola, mas os profissionais que vieram ao barracão da Rocinha se limitaram ao óbvio e nada acrescentaram ao nosso carnaval. Foi um desfile rápido, impulsionado por uma bateria muito boa que tentou salvar um samba que mais parecia um jingle, tantas eram as linhas dedicadas aos desenhos e filmes produzidos pela MGM. As baianas desfilaram com a fantasia “Você Já Foi à Bahia?”; estavam simples, mas bonitas. Infelizmente, o desfile da escola, apesar de alguns pontos positivos, foi digno de ser esquecido. Fiquei com saudade da Rocinha dos carnavais do grupo de acesso.
As flores coloridas da Unidos da Tijuca
UNIDOS DA TIJUCA – “Viagem Pitoresca Pelos Cinco Continentes Num Jardim”, do carnavalesco Lucas Pinto, foi o enredo com o qual a Tijuca se apresentou em 97. A história do Jardim Botânico, desde sua fundação até os dias atuais, foi contada pelas fantasias dos 2500 componentes e pelas oito alegorias da escola, que abriu seu carnaval com uma comissão de frente das mais bonitas, mostrando a chegada da família real ao Brasil. Gostei muito! O abre-alas também me agradou, pois o pavão, muito imponente, foi montado numa posição completamente nova, cercado pelas palmeiras imperiais e com símbolos da realeza à frente. Em seguida, surgiu uma pequena ala de baianas, com fantasias apenas corretas e bastante simples. Após o carro que representou a criação do Jardim Botânico, foi a vez da bateria se apresentar. Os ritmistas estavam vestidos nas cores da escola e simbolizavam a Guarda Imperial. A cadência estava acelerada demais para o meu gosto, mas, mesmo assim, a bateria esteve firme e acompanhou bem o samba apenas razoável que a escola cantava. Um segundo e pequeno grupo de baianas, com fantasias pouco elegantes, surgiu na seqüência do desfile. Mais interessantes, no entanto, estavam as alas vestidas de borboletas e de vitórias-régias que antecederam o carro “As Estufas e Arredores”, de bonita concepção. No geral, a escola apresentou um visual irregular, com alguns bons momentos, que foram sufocados por um desfile muito simplório para uma escola tão tradicional como a Unidos da Tijuca. Esperava-se mais!
Conjunto visual da Porto da Pedra
UNIDOS DO PORTO DA PEDRA – Faltavam alguns minutos para as dez da noite quando os primeiros componentes da escola de São Gonçalo apontaram na armação da Rua Marquês de Sapucaí. O nervosismo entre os diretores da agremiação era geral, pois o caminhão que trazia as roupas das baianas e os chapéus da bateria havia ficado preso na Ponte Rio-Niterói, que estivera fechada no domingo em vários momentos, devido a um acidente. As baianas, em número muito diminuto, chegaram a se “armar” atrás do abre-alas (conforme previsto). A sirene que anunciava 5 minutos para o início desfile já havia tocado e muito ritmistas ainda estavam sem seus chapéus quando uma correria tomou conta da concentração e da armação. A sorte parecia estar de volta, pois, em cima da hora, a apreensão e a decepção deram lugar aos sorrisos. As roupas das baianas haviam chegado e os chapéus da bateria também. Rapidamente, as baianas que estavam atrás do abre-alas deram passagem a duas alas que vinham a seguir e se juntaram às demais colegas que, às pressas, vestiam suas saias. Por conta desses problemas, a escola só pisou firme na Sapucaí quando os cronômetros já apontavam seis minutos de desfile. Com o enredo “No Reino da Folia, Cada Louco Com Sua Mania”, do carnavalesco Mauro Quintaes, a Porto da Pedra conseguiu causar um bom impacto na sua abertura com uma comissão de frente vestida de Napoleão e um abre-alas que mostrou o tigre, símbolo da agremiação, em meio ao “Portal da Loucura”. As alas foram organizadas com bastante coesão e o planejamento de cores foi dos mais agradáveis. As primeiras fantasias mostraram os delírios de D. Maria I, a rainha louca, que também foi motivo de inspiração para o figurino das baianas, de bela combinação cromática, com tons que iam do rosa claro ao vermelho, misturados ao dourado. O segundo setor do desfile, dedicado ao Fantasma da Ópera, também estava muito bom. Adorei a ala “Sons da Loucura”, que desfilou com um teclado estilizado e um costeiro de plumas amarelas de muito efeito. No carro que se seguia, a fumaça branca dava o toque de mistério que o carnavalesco queria passar. A partir do setor dedicado a Dom Quixote, no entanto, a escola começou a ter algumas irregularidades no visual, pois os carros, não tão bons quanto os três primeiros, passaram a quebrar um pouco o equilíbrio visual do conjunto. A bateria, além de bem vestida, apresentou-se bem e manteve o público aceso durante toda a passagem da escola. Aliás, o samba, apesar de não ser lá essas coisas, caiu no gosto popular e foi bem cantado pela escola e pela platéia. Os carros de Raul Seixas e do Menino Maluquinho também não me agradaram muito, pois eram apenas corretos e bem acabados, mas não provocavam nenhum impacto. As fantasias das alas, no entanto, continuavam muito boas, apesar de certas repetições de formas. A ala que apresentou a fantasia “Mosca Louca”, com asas feitas com tecido transparente, causou um ótimo efeito. Também gostei muito de uma ala em tons de verde que homenageou o bailarino Nijinsky, personagem principal do carro “Prelúdio do Entardecer de um Fauno”, no qual foi montada, em estilo “art nouveau”, uma réplica do palco do Teatro Parisiense. Belos anjos em azul e branco abriram o último setor do desfile, dedicado ao Bispo do Rosário, personagem central do último carro, cuja concepção me agradou tanto quanto a das primeiras alegorias. Foi um belo desfile!
Bob Nelson e Mírian Pérsia celebraram os 50 anos do Império Serrano
IMPÉRIO SERRANO – Ainda emocionados com a morte de Mestre Fuleiro, um dos nomes mais importantes da gloriosa história imperial, os 4500 componentes, divididos em 37 alas, abriram o cortejo verde e branco com a responsabilidade de mostrar um enredo que, quando lançado, pouco agradou os componentes tradicionais: “O Mundo dos Sonhos de Beto Carrero”, do carnavalesco Jerônimo Guimarães. Como a escola comemorava seu jubileu de ouro, esperava-se um enredo que relembrasse as glórias do Império, mas as comemorações pelo cinqüentenário ficaram restritas apenas a algumas linhas do samba e às primeiras alas. No grito de guerra, Jorginho do Império, o intérprete, “cantou” o nome de várias personalidades da escola, proporcionando um momento de muita emoção e foi, aliás, com muita emoção que o Império iniciou seu desfile, cantando seu samba de boa melodia. Os “Caubóis Sonhadores” da comissão de frente fizeram uma apresentação que pouco chamou a atenção, pois suas fantasias não eram das mais inspiradas e, além disso, um dos componentes teve sérios problemas com seu esplendor. O abre-alas era bem grande e trazia bigas que antecediam a coroa imperial, em torno da qual estavam figuras tradicionais do Império Serrano. As primeiras alas, conforme já mencionei, fizeram uma homenagem aos cinqüenta anos da escola, com fantasias predominantemente trabalhadas em verde, branco e dourado. Componentes da velha-guarda fecharam esse primeiro setor. Em seguida, o carnavalesco introduziu as festas catarinenses, através de um carro pouco imaginativo, todo trabalhado em espelhos e com composições nada elegantes. Os figurinos das alas que surgiram a seguir estavam bem solucionados, com destaque para os alemães da festa da cerveja. A bateria, bem vestida com a fantasia de músicos do parque, aproximou-se do boxe com alguma dificuldade, em decorrência do buraco deixado à sua frente. A cadência, como sempre, estava ótima e, certamente, as notas seriam altas. Na seqüência do desfile foram mostradas alas africanas muito bem fantasiadas e o carro “A Ilha dos Dinossauros”. Os capítulos do enredo (ou as atrações do parque) eram anunciados por pequenos adereços carregados por sambistas. Aliás, as camisetas desses carregadores trariam problemas à escola na apuração. Gostei de uma ala de bruxos, que antecedeu o carro “Trem Fantasma”, encimado pelo destaque Ricardo Machado, muito bem fantasiado de Capitão Flick. As alas que seguiram o carro também me agradaram, principalmente as fantasias de corsários e damas, feitas com materiais de primeira, que produziam um belo efeito. O Império mesclou momentos de muita beleza (proporcionados pelos dólares investidos por Beto Carrero em troca do merchandising) com momentos de pouca inspiração. A ala das baianas, ricamente vestida, desfilou no setor do “Castelo Medieval”, muito bem representado por um carro cheio de luzes. As senhoras da Serrinha estavam bonitas, nas cores da escola, mas seus chapéus nada tinham a ver com o torço da indumentária tradicional. As alegorias da escola eram as maiores que haviam entrado na Sapucaí até aquele momento, já que a Rocinha e a Tijuca optaram por carros menores, enquanto a Porto da Pedra optou por alegorias de porte médio. Antecedendo o Carro das Águas Dançantes, uma das principais atrações do parque (e da escola), surgiu uma ala riquíssima, com plumas pretas e muito strass, representando o “Cisne do Parque”. No último carro, denominado “Cidade Espacial”, mais luzes, movimentos e efeitos de fumaça. Nada disso, no entanto, conseguiu conquistar o público, que se manteve frio durante a maior parte do desfile, que além do enredo (muito ruim), pecou pelos constantes buracos deixados pelas alas.
Yaôs amazônicas na Grande Rio
ACADÊMICOS DO GRANDE RIO – Com cerca de 4000 componentes, a escola de Caxias apresentou o enredo “Madeira Mamoré, a Volta dos Que Não Foram...Lá no Guaporé”, do carnavalesco Alexandre Louzada. O samba composto por Sabará, Muralha, Jarbas da Cuíca e Grajaú, agradou os críticos e, de fato, era um dos melhores do ano, mas, assim como o enredo, não chegava a empolgar, pois convenhamos que os acontecimentos em torno da construção da ferrovia, no início do Século XX, são difíceis de serem tratados numa festa tão esfuziante quanto o carnaval. A comissão de frente abriu o desfile com a fantasia “Ferrovia do Diabo”, toda feita com tubos e tecidos metalizados, num desenho muito moderno, que fez lembrar algumas criações do carnavalesco Fernando Pinto. O abre-alas, denominado “Mad Maria”, causou um impacto favorável com um trem muito detalhado, que apitava e soltava vapor pela chaminé. A ala com a fantasia “Caldeirão do Inferno”, logo atrás, estava bem vestida e fez evoluções pertinentes à sua proposta, que era de mostrar os perigos enfrentados pelos trabalhadores na construção da ferrovia. Damas e cavalheiros, representando os imigrantes, se apresentaram a seguir, antecedendo o carro “Tratado de Petrópolis”. Atrás do carro, duas alas em tons de verde, conseguiram causar um belo efeito. A boa bateria, dirigida por mestre Mauricio, estava primorosamente vestida de jacaré, num verde suave e encantador. A entrada dos ritmistas no boxe se deu de forma perfeita, abrindo passagem para a ala dos botos e para uma bela ala de yaôs vestidas de vitórias-régias. No entanto, antes da passagem do carro “Trilhos Até Debaixo D’água” (adornado com jacarés, botos e muito espelho), houve um buraco perigoso, que, felizmente, logo foi preenchido. O carro “Mundo de Perfume e Fantasia”, com suas esculturas em ouro velho, adereços florais e belos destaques, foi um dos mais bonitos de todo o desfile. Aliás, a Grande Rio levou para a Sapucaí algumas das melhores alegorias do ano. Um setor com alas vestidas de laranja e dourado abriu passagem para o carro “Cada Dormente Uma Cruz”, com a presença dos mosquitos e dos corpos dos trabalhadores mortos, dispostos em cruzes estilizadas. As baianas, estranhamente vestidas de aranhas, rodopiaram suas saias, mas a “modernosa” fantasia prejudicou a ala. Gostei bastante das evoluções e dos figurinos de Robson e Ana Paula, primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira. O verde de suas plumas e a representação dos trilhos na saia de Ana Paula conseguiram o efeito desejado. No carro “Outros Perigos” uma serpente sobre trilhos de neon causou um impacto muito grande, não repetido na passagem do último carro (o que menos gostei no desfile). Apesar de uma apresentação muito correta de seu enredo, a Grande Rio teve problemas técnicos (evolução, harmonia) que acabaram por prejudicar um pouco sua apresentação, que, em nenhum momento, conseguiu empolgar o público, talvez pela seriedade do tema proposto. Terminou seu desfile quase estourando o tempo de 80 minutos, mas, apesar dos percalços, fez um desfile bonito, principalmente pela grandiosidade dos carros: os melhores até aquele momento.
Conjunto visual da Mangueira
ESTAÇAO PRIMEIRA DE MANGUEIRA – Passava das três da madrugada quando a Mangueira iniciou seu desfile com o enredo “O Olimpo é Verde e Rosa”, tema inspirado pela candidatura do Rio de Janeiro à sede da Olimpíada de 2004, de autoria do carnavalesco Oswaldo Jardim. Mesmo com um samba muito fraco, a escola conseguiu empolgar desde sua entrada, graças, talvez, ao recurso das bandeirolas, espalhadas por todo o Sambódromo. A comissão de frente, mais uma vez dirigida por Débora Kolker, teve um péssimo desempenho. Além de uma fantasia pavorosa, a coreografia era muito ruim e uma das componentes estava sem o chapéu. Felizmente, o abre-alas, ao contrário da comissão de frente, conseguiu um efeito favorável, com esculturas de faunos e de cavalos alados, em meio a cachos de uvas e colunas gregas, que sustentavam, além da velha-guarda da escola, os tradicionais ramos de louro da bandeira mangueirense. A primeira ala, predominantemente em verde, desfilou a fantasia “Infantaria de Delphos”, que contrastou muito bem com o figurino lilás da segunda ala: “Homem de Argo”. Outras alas de soldados e guardiões gregos surgiram na seqüência, antecedendo o belo carro “As Guerras”, todo confeccionado em tons de terra. Bonitas alas referentes aos deuses gregos tomaram conta da pista para abrir caminhos ao carro “As Oferendas”, todo ornamentado com esculturas feitas em espuma, que passavam uma leveza extraordinária. Tânia Índio do Brasil, à frente da alegoria, esbanjou luxo com sua fantasia trabalhada com penas de pavão amarelas e faisões. A tradicional ala “Brasinhas e Brasões”, com turíbulos nas mãos, estava bem fantasiada, mas abriu claros enormes na pista, devido à apresentação do primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira: Marquinho e Giovana, que se vestiram de nobres e fizeram uma exibição impecável. A bateria, dirigida por Alcir Explosão, vestiu o figurino “A Nobreza do Barão” e , como sempre, esteve muito firme nas marcações. As baianas, fantasiadas de “Chama Sagrada”, fizeram uma ótima apresentação, facilitada por suas saias e chapéus bastante leves. O carro “O Olimpo”, cuja parte inferior era trabalhada com esculturas em tons de terra e a superior com esculturas em branco, devia ter ficado exposto em museu, tão bonita era sua concepção e realização. Enquanto o enredo abordou a história dos jogos antigos, a Mangueira se apresentou muito bem, mas, infelizmente, o nível não foi mantido quando o tema passou a retratar os jogos da era moderna. Houve uma quebra de linguagem muito acentuada quando os esportes olímpicos começaram a ser mostrados através de alas e adereços que se misturavam, fazendo com que a escola perdesse um pouco o seu equilíbrio visual. O enredo continuou legível, mas a beleza inicial se perdeu em meio aos estandartes e às bandeirolas referentes às delegações. Os dois últimos carros não conseguiram causar impacto, mas, mesmo assim, o desfile continuou agradável, graças à empolgação dos 4500 componentes da escola, que por pouco não estourou o tempo máximo permitido pelo regulamento. Apesar dos problemas de concepção estética, o desfile foi muito bom, mas poderia ter sido melhor se Oswaldo Jardim tivesse optado por uma leitura diferente dos jogos modernos.
O carnaval de Chiquinha Gonzaga foi revivido com muita beleza no desfile da Imperatriz
IMPERATRIZ LEOPOLDINENSE – “Eu Sou da Lira...Não Posso Negar”, uma homenagem a Chiquinha Gonzaga, foi o enredo que a carnavalesca Rosa Magalhães preparou para a Imperatriz brilhar no desfile de 1997. Como vinha acontecendo desde a década de 70 e, principalmente, após a chegada do coreógrafo Fábio de Mello à escola, a comissão de frente iniciou o desfile com a certeza da nota máxima: eram homens primorosamente vestidos com uma capa que formava um teclado de piano. Com uma coreografia perfeita, valorizada pela indumentária, a comissão foi muito aplaudida e sua beleza se estendeu ao abre-alas, que fazia uma síntese do enredo com as figuras típicas do carnaval, misturadas a liras e candelabros, num delírio para os olhos. Três alas muito bonitas, vestidas de reisado, abriram caminho para o Carro do Presépio, que fazia alusão à primeira música composta por Chiquinha, aos 11 anos, em sua casa. Nessa alegoria, gostei especialmente dos anjos de asas muito suaves que sustentavam turíbulos muito detalhados. Alas com partituras e notas musicais, vestidas em tons que iam do amarelo ao laranja, misturados ao branco e ao preto, antecederam o carro “Loja de Instrumentos”, que apresentou a atriz Rosamaria Murtinho no papel da homenageada. As alas referentes ao carnaval, com alegorias de mão trabalhadas com tules, causaram um belíssimo efeito, principalmente pelos tons de violeta e azul que, misturados ao ouro e ao prata, obtiveram um resultado espetacular. O carro “Baile de Máscaras”, todo decorado com pompons, era tão bonito que eu gostaria de tê-lo em casa. No setor dedicado ao carnaval de rua, Rosa Magalhães fez uma longa seqüência de alas referentes ao cordão Rosa de Ouro, dentre as quais eu destaco a belíssima ala das baianas, que evoluiu lindamente com suas maravilhosas fantasias. Os ritmistas, sob o comando de mestre Beto, vestiram-se de pierrôs brancos e tiveram uma boa performance, embora eu tivesse sentido falta da força do naipe de tamborins. O samba, que no disco era até animado, passou sem empolgar o público e os próprios componentes, que evoluíram sem muito vigor e ainda foram prejudicados pela quebra do segundo carro (já na saída da pista), fato que atrapalhou a fluidez das alas. Outro problema aconteceu durante a apresentação do primeiro casal de mestre-sala e porta-bandeira: os competentes Chiquinho e Maria Helena, que desfilaram lindamente, mas deixaram claros na pista. Após a entrada da bateria no boxe o desfile cresceu em empolgação e seguiu bem até o final, com a passagem do Carro do Palácio do Catete, muito bem iluminado e com a presença de Walquíria Miranda, como Dona Nair de Tefé. Apesar da beleza indiscutível com que a Imperatriz se apresentou, eu esperava um pouco mais da Rosa no desenvolvimento do enredo. Ela foi perfeita na concepção visual da escola, mas muitos aspectos importantes da vida de Chiquinha Gonzaga foram deixados de lado, o que, na minha opinião, tornou o enredo um pouco falho.
A loucura do Salgueiro invadindo a Sapucaí
ACADÊMICOS DO SALGUEIRO – Se a loucura da Porto da Pedra foi comportada e de fácil assimilação, o mesmo não se pode dizer do enredo do Salgueiro, que com “De Poeta, Carnavalesco e Louco...Todo Mundo Tem um Pouco” levou os delírios do imaginário criativo às ultimas conseqüências. Com 4500 componentes, divididos em 33 alas, o Salgueiro iniciou sua apresentação com o dia começando a amanhecer, por volta das 6h10. O carnavalesco Mário Borriello, campeão com a escola em 93, estava de volta, mas, ao contrário do ano do título, ele optou por uma escala cromática que não se definiu em nenhum momento, tantas foram as cores utilizadas para ilustrar o enredo. A comissão de frente, vestida com os fardões da ABL, na fantasia chamada de “Navegantes do Imaginário”, fez uma apresentação bonita, mas foi prejudicada pelo excesso de “diretores” de camiseta branca que sujaram a pista, prejudicando a escola. O carro abre-alas mostrou uma esfinge com cabelos de serpente para representar o enigma da mente e as primeiras alas, assim como na escola de São Gonçalo, também fizeram alusão aos delírios de Dona Maria I, com fantasias de pajens, deuses africanos e flores carnívoras. No segundo carro, talvez o melhor da escola, apareceu o destaque Júlio Machado (Xangô do Salgueiro) com uma fantasia em homenagem a Oxossi. As obras de Hieronymus Bosch foram mostradas nas alas que se seguiram. Gostei bastante da ala “A Nave dos Loucos”, que antecedeu o carro “O Jardim das Delícias”. A ala vestida com o figurino “Campo de Trigo” me agradou bastante pelo chapéu, feito em palha e com dobras muito atraentes. Ladeando as alas, adereços carregados por sambistas davam mais volume ao conjunto, no entanto, deixavam a desejar em termos de acabamento. O samba, puxado pelo Quinho, funcionou para os componentes, que passaram bastante empolgados, embora estivessem cantando uma obra de qualidade muito duvidosa. A bateria de mestre Louro, boa como sempre, representou os “Passageiros da Barca do Sol”. Aliás, o setor da “Barca do Sol” foi um dos melhores do desfile, principalmente quando o carnavalesco utilizou tons de laranja, misturados ao vermelho e ao dourado. A ala das baianas fechou o desfile, com a fantasia “Girando Com os Girassóis”. Elas estavam leves e rodopiaram com agilidade as suas saias de tons alaranjados. O Salgueiro fez um desfile bonito, mas faltou capricho no acabamento das fantasias e dos carros e, sobretudo, faltou um pouco mais de clareza no desenvolvimento de um enredo muito rico.
Destaque do segundo carro alegórico da Santa Cruz
ACADÊMICOS DE SANTA CRUZ – Com “Não Se Vive Sem Bandeira”, do carnavalesco Albeci Pereira, a Santa Cruz abriu a segunda noite de desfiles disposta a se safar das quatro últimas posições que determinavam o rebaixamento. Os arautos da comissão de frente apresentaram-se bem, com suas fantasias emplumadas e luxuosas que antecediam o abre-alas, no qual a coroa imperial, símbolo da agremiação, surgiu ladeada por anjos e belas mulheres. Na primeira ala, assírios vestidos de amarelo, ouro e branco, desfilaram bonitas fantasias. O carro “Bandeiras e Brasões”, segundo a entrar na pista, tinha movimentos giratórios, mas não conseguiu causar impacto. Mais interessante estava o Carro do Castelo Medieval, que precedeu a ala das baianas, dividida em dois figurinos diferentes: um grupo com chapéus medievais e outro com coroas. Senti falta dos elementos tradicionais (torço, colar, pano da costa), mas, mesmo com fantasias que não me agradaram muito, as senhoras evoluíram bem. A bateria, com uma cadência muito boa, estava garbosamente trajada com a fantasia de “Conde de Borgonha”. Cláudio Tricolor, com o auxilio luxuoso de Quinzinho e do conjunto vocal As Gatas, tentava empolgar a escola, mas o samba não ajudava. O carnaval da Santa Cruz pecou pela extrema irregularidade, que se acentuou ainda mais da metade para o final do desfile, quando surgiram alegorias e alas muito pouco inspiradas, que sequer passavam as informações do tema, muito mal desenvolvido pelo carnavalesco. O último setor mostrou as bandeiras do samba, com o Carro do Carnaval e duas alas em homenagem à Portela e à Mangueira. O carro “Alegria do Povo” fechou a confusa apresentação da escola.
A explosão de cores da Viradouro
UNIDOS DO VIRADOURO – Os 3800 componentes da escola de Niterói entraram na Sapucaí mordidos pela péssima colocação no ano anterior. O enredo “Trevas! Luz! A Explosão do Universo”, do carnavalesco Joãosinho Trinta, partia da teoria científica do Big Bang para explicar o surgimento do universo. Recuperando-se de um AVC, Joãosinho foi aclamado pelo povo do Setor 1, mesmo antes do desfile começar. Aliás, desde que seus componentes pisaram na Sapucaí, a impressão que se tinha é de que a Viradouro faria um grande desfile, o que de fato aconteceu. Os quinze membros da comissão de frente vestiram-se de prata e negro na fantasia “O Átomo Vagueia Pelas Trevas” e fizeram uma excelente apresentação. Atrás, o abre-alas (As Trevas), todo em negro, causou um impacto muito favorável, que conquistou o público, já entusiasmado com a excelente bateria de mestre Jorjão e com o samba de Dominguinhos (intérprete oficial), Mocotó, Flavinho Machado e Heraldo Faria. A primeira ala, também vestida de preto, fazia uma bela composição com a alegoria inicial e com a ala que se seguia, trajada com a fantasia “Prenúncios de Luz”. As encantadoras baianas, com o figurino “Seres de Luz”, estavam de branco e prata, com saias feitas com tecido metalizado e com delicadas asas transparentes. O segundo carro, denominado “A Luz”, brilhava sob a iluminação do Sambódromo, causando um efeito muito bonito. A bateria, bem cadenciada e fazendo uma “paradinha funk” (uma bobagem para o meu gosto), estava vestida com a fantasia “Terra em Explosão”, de excelente efeito no conjunto. Aliás, de um modo geral, as fantasias da escola funcionaram muito bem, fazendo com que algumas falhas de acabamento fossem minimizadas. No carro “A Terra” Joãosinho Trinta ressaltou a esfera terrestre ainda incandescente, com um movimento bem interessante. Após o setor que mostrou a água (todo em azul claro, branco, prata e verde-água), surgiram alas com cores quentes. O figurino da ala das salamandras era uma beleza e foi muito valorizado com a coreografia feita com as asas alaranjadas. No Carro do Fogo (ornamentado em dourado, vermelho e laranja) os materiais metalizados viraram labaredas, formando dragões exuberantes, que eram realçados por luzes muito pertinentes. Plumas brancas encimaram as alas que antecederam o Carro do Ar, onde pássaros estilizados, em meio a tecidos brancos, giravam como num carrossel. Depois do carro, a escola voltou a explodir em cores para exaltar a natureza. A ala vestida com a fantasia “Os Senhores da Guerra” estava muito bonita e antecedeu o carro que homenageou Gandhi. Alas referentes ao carnaval fecharam a excelente apresentação da Viradouro. Era o setor denominado “A Explosão da Alegria”. De fato, a Viradouro não foi só uma explosão de alegria, mas, também, uma demonstração de que desfile de escola de samba é, sobretudo, emoção. Alguns erros foram cometidos na pista, principalmente quando a bateria entrou no boxe, mas isso não foi suficiente para abalar a força de um desfile com pinta de campeão.
Nas belas alegorias da Ilha, o Rio do início do século passado
UNIÃO DA ILHA DO GOVERNADOR – Roberto Szanieck, carnavalesco da escola, já havia demonstrado em outras oportunidades a preocupação com a qualidade de seus enredos. Para o carnaval de 97 a coisa não foi diferente. Com “Cidade Maravilhosa, o Sonho de Pereira Passos”, o carnavalesco contou na Sapucaí, com muito bom humor, uma história que mudou o Rio de Janeiro, estética e socialmente: a revolução urbanística proposta pelo prefeito Pereira Passos. A comissão de frente, com uma coreografia muito prejudicada pelas fantasias mal solucionadas, abriu passagem para o abre-alas e para os 3500 componentes da escola. A partir daí, um delicioso clima de “Belle Époque” tomou conta da pista. As primeiras alas estavam alinhadas, com boas fantasias. Gostei muito do figurino da ala da arquitetura, que desfilou pouco antes do segundo carro, que trazia o projeto da nova cidade. Aliás, os carros da Ilha, de uma forma geral, me agradaram bastante, mas alguns estavam inacabados, como o que representou as maravilhas do Século XX. As baianas estavam ricamente vestidas, mas problemas nas saias de algumas senhoras impossibilitaram uma evolução maior e um resultado plástico mais bem sucedido. Uma pena! Os ritmistas, lindamente vestidos com a fantasia “Exército de Bufões”, mantiveram o ritmo, mas, para o meu gosto, a bateria da Ilha estava acelerada demais e isso, a meu ver, prejudicou até o samba, que era bom, mas não foi muito bem cantado. A Exposição Nacional de 1908, que celebrou os cem anos da abertura dos portos, foi mostrada num belo e bem detalhado carro alegórico, mas eu gostei mesmo foi do carro “Vitrine da Avenida Central”, com suas escadarias, lustres e cortinas vermelhas. Atrás da alegoria que representou o Teatro Municipal surgiu uma belíssima ala com adereços egípcios, alusivos ao balé da Opera Aída. O carnaval de rua e os bailes de máscaras foram mostrados a seguir, com alas elegantemente trajadas em tons muito harmoniosos. Apesar de pequenos problemas em alguns carros, gostei muito do carnaval da Ilha. Aliás, considero seu enredo um dos melhores do ano. A escola só não foi melhor porque seu samba não funcionou e, também, porque a direção de harmonia calculou mal o tempo de desfile, o que fez com que o último carro tivesse que ficar parado por uns cinco minutos em frente ao recuo da bateria.
A Estácio de Sá e os aromas do Egito
ESTÁCIO DE SÁ – Com o enredo “Através da Fumaça, o Mágico Cheiro do Carnaval”, do carnavalesco Max Lopes, a Estácio pretendia contar a história do perfume nas relações humanas, fato que, nem de longe, foi alcançado, tantos foram os problemas que a escola enfrentara na confecção de seu carnaval. Os protótipos eram animadores e a presença de um carnavalesco de peso poderia credenciar a tradicional agremiação do Morro de São Carlos aos primeiros lugares, mas, para uma escola sem quadra e sem recursos, a tarefa da Estácio não seria das mais fáceis. Apesar do carnaval estar inacabado, a escola tinha que desfilar e os 3200 componentes pisaram firmes na Sapucaí, como se não houvesse nenhum problema. Na condução do samba, um David do Pandeiro animado e no comando da bateria (acelerada, mas irresistível), um mestre que se despedia da escola: Ciça. A comissão de frente, vestida de “Leão Coroado”, fez o que pôde, mas a máscara dos componentes era, no mínimo, de gosto duvidoso. Antes do abre-alas, decorado com cartas de tarô em meio à fumaça branca, surgiu a figura simpática de Onira Pereira, porta-estandarte tradicional do sul do país, que desfilara com Max Lopes na Vila Isabel no ano anterior. No primeiro setor, logo após o abre-alas, o primeiro problema sério: um pequeno grupo de baianas com fantasias incompletas. O Carro da Babilônia, segundo a entrar na pista, estava interessante, num bom jogo de cores, mas notava-se que o projeto era mais ambicioso. A bateria, vestida de “Folia”, empolgou o público, principalmente quando os ritmistas se agachavam, o que não era nenhuma novidade, já que na própria Estácio, no ano do “Tititi”, o mesmo acontecera. O Carro do Egito era grande e trazia uma pirâmide bastante estilizada, porém de bom efeito. As fantasias egípcias estavam chamativas, como, aliás, boa parte dos figurinos da Estácio. O problema é que a falta de acabamento em alguns carros e em algumas fantasias era muito evidente, mais ainda no momento em que passou diante de nossos olhos uma segunda ala de baianas (muito pequena) com as senhoras completamente descompostas. Uma tristeza! O desfile se encerrou com o perfume no carnaval, com bonitas alas em preto e branco e um carro com uma lança perfume em meio a esculturas caricaturadas dos carnavalescos. O engraçado, pra não dizer trágico, é que a escultura do Max, que vinha sobre a lança perfume, caiu quando o carro estava no meio da pista, num castigo para um grande carnavalesco que desenvolveu muito mal um enredo que poderia ter sido muito interessante.
Marlene Paiva esbanjou luxo no abre-alas da Mocidade
MOCIDADE INDEPENDENTE DE PADRE MIGUEL – Campeã com méritos em 96, a escola de Padre Miguel se preparou forte para levar o bicampeonato. Com o enredo “De Corpo e Alma na Avenida”, do carnavalesco Renato Lage, a escola abriu seu desfile com uma comissão de frente que fez movimentos ágeis e precisos para representar que o homem é um ser aquático. No abre-alas, a sempre elegante Marlene Paiva vestiu a fantasia “A Vida” e nem um pequeno problema, que fez com que o carro passasse sem sua iluminação total em grande parte da pista, tirou o brilho da exuberante alegoria. Na primeira ala, foi mostrada a corrida pela sobrevivência, em uma fantasia de fácil leitura e de acabamento preciso. Adorei a representação dos glóbulos brancos e vermelhos e, mais ainda, a excelente evolução da ala das baianas, sublimemente vestidas como células-mãe. No segundo carro, circuitos de computadores mostraram o cérebro em formação, numa bela idéia do carnavalesco. Rogério e Lucinha Nobre, mestre-sala e porta-bandeira da escola, defenderam o pavilhão com elegância, mas a indumentária (mais apropriada ao Bolshoi) não me agradou nem um pouco, pois porta-bandeira, para o tradicional aqui, tem que ter saia longa. No Carro do Coração, Renato Lage, através de uma iluminação fantástica, conseguiu mostrar com perfeição a circulação sanguínea e, além disso, caprichou na fantasia dos destaques de composição e encheu meus olhos com excelentes esculturas. Também gostei muito do carro e das alas que retrataram o aparelho respiratório e achei muito bem-humorado o carro que retratou o aparelho digestivo. Esculturas brancas, maravilhosamente bem realizadas, ocuparam espaços no Carro dos Cinco Sentidos. Nesse setor, uma das alas que mais me agradou foi a referente à visão. Também gostei muito da escultura principal da alegoria de ambientação grega alusiva à beleza física e da criatividade da última ala, fantasiada de caveira. Contando com um dos melhores sambas do ano e com um visual muito bem cuidado pelo carnavalesco e sua equipe, não foi difícil para a Mocidade conquistar o público. Aliás, parte importante desse sucesso também se deve à excelente cadência da bateria comandada por Mestre Coé. O único senão ficou por conta de um erro primário dos homens que controlaram o tempo de desfile, pois com 50 minutos o último setor da escola já estava em frente ao boxe da bateria, na Rua Salvador de Sá. Isso fez com que as últimas alas tivessem que evoluir sem avançar até que o tempo mínimo de 65 minutos fosse atingido. Lamentável!
Conjunto visual da Portela
PORTELA – Devido a problemas na dispersão, a autorização para o inicio de desfile da Portela tardou a chegar, o que não diminuiu a garra dos sambistas, pois o “esquenta” da escola foi animadíssimo e teve a participação ilustre de Paulinho da Viola cantando, ao lado de Rixxa, “Foi Um Rio que Passou Em Minha Vida”. Enquanto os problemas na Rua Frei Caneca (com carros da Mocidade) não eram solucionados, a Portela fazia seu carnaval para o Setor 1 e seus diretores tentavam, às pressas, consertar uma das garras da águia, que se espatifara em vários pedaços. Passava um pouco das três horas quando a escola, depois de muito esperar na armação, conseguiu entrar pra valer na Sapucaí, com seu enredo “Linda, Eternamente Olinda”, do carnavalesco Ilvamar Magalhães. Os arautos da comissão de frente evoluíram bem, mas o carro abre-alas, embora com o problema da garra da águia parcialmente solucionado, estava longe de causar um impacto favorável. Aliás, a escultura da águia era de uma precariedade e de um mau gosto incríveis. Além disso, os efeitos programados para o carro insistiam em falhar. Felizmente, Carlos Reis, destaque principal do carro, com a fantasia: “Glória a um Fidalgo”, estava alinhado como sempre. E se o abre-alas não me agradou, o contrário aconteceu com as primeiras alas, representativas da fauna e flora pernambucanas. Elas estavam elegantes, numa bonita combinação de tons de azul, salpicados de detalhes em prata, ouro e verde. O segundo carro, que era uma continuação do tema desenvolvido nas primeiras fantasias, estava bonito, assim como as baianas, que abriram o setor do enredo dedicado à cana-de-açúcar, com a fantasia “O Ouro Branco”. Gostei muito da fantasia em tons de azul e lilás da ala que tratou da expulsão dos holandeses e, mais ainda, de uma ala toda em branco que representou a paz, já no setor do enredo dedicado à religiosidade. Durante todo o desfile, os figurinos foram muito superiores às alegorias, que, com raras exceções, tinham uma concepção muito pouco criativa. O samba, muito fraco, ganhou vida na avenida, graças ao fenomenal intérprete e à boa cadência da bateria que, embora com erros, conseguiu imprimir um bom ritmo e “salvar” a qualidade musical do espetáculo. Quando o desfile estava próximo do final e o enredo já “passeava” pelo carnaval de Olinda, a harmonia, a evolução e o conjunto da escola foram completamente comprometidos por causa de uma ala que se esgarçou à frente do último carro. Além dos claros, o conjunto de fantasias da Portela foi prejudicado pela presença injustificável de centenas de componentes vestidos com camisetas brancas, que sujaram a escola, demonstrando uma total falta de organização dos dirigentes da agremiação que, ao permitirem tal absurdo, arruinaram qualquer possibilidade de boa colocação para a escola que eles deveriam defender. A Portela, nossa grande e amada escola, fora mais uma vez prejudicada pela extrema incompetência e amadorismo de alguns de seus dirigentes, mas, como o azul da Portela tem uma aura especial, o desfile foi simpático, mesmo com todos os erros.
As baianas de Nilópolis
BEIJA-FLOR DE NILÓPOLIS – Faltavam cerca de quinze minutos para as cinco da madrugada quando os primeiros dos 3800 componentes da escola começaram a desfilar. O enredo “A Beija-Flor é Festa na Sapucaí” nasceu da imaginação de Fernando Mello, um garoto de 17 anos, e foi desenvolvido pelo carnavalesco Milton Cunha. Na comissão de frente, pela primeira vez comandada por Gisleine Cavalcante, a escola abordou um tema infantil através de fantasias multicoloridas: “A Festa no Céu”. O primeiro carro, com a presença de beija-flores muito bonitos e de garrafas de champagne um tanto quanto disformes, abriu passagem para as 41 alas da escola. O enredo começou no reveillon, com uma bonita homenagem a Iemanjá. As belas baianinhas, pra lá de estilizadas, representaram o bolo do jubileu de ouro do município de Nilópolis, motivo do segundo setor do enredo. A ala da cana-de-açúcar, com componentes completamente descompostos, antecedeu o bonito carro intitulado de “Festa Nilopolitana”, mas a alegoria referente ao carnaval estava ainda melhor, com máscaras de bom efeito e com a presença de Linda Conde, destaque tradicional da Beija-Flor. As baianas, que tinham nas saias arco-íris que formavam uma serpente, fizeram alusão à festa de Oxumaré, também lembrada no carro “Festa do Candomblé”, de bela concepção. E o desfile seguiu sem grandes surpresas até o final, com alas referentes à festa do dia das mães, ao dia dos pais, aos folguedos juninos, entre outras festividades. Cronologia quase não houve, o que contribuiu ainda mais com a pobreza do tema, que não deixou de exaltar o Halloween, festa tipicamente americana que foi mostrada num grande e bonito carro. O Natal da Beija-Flor foi mais sensual do que prevê uma festa cristã, mas a alegoria final até que tinha seus encantos. No geral, a Beija-Flor fez um desfile bem harmonioso em termos de cores e formas, mas não conseguiu empolgar, talvez devido a seu pouquíssimo inspirado samba-enredo ou, quem sabe, a seu tema muito pouco consistente. A festa foi bonita, mas morna.
O sol iluminou o desfile da Vila
UNIDOS DE VILA ISABEL – “Não Deixe o Samba Morrer”, enredo escrito pelo jornalista Cláudio Vieira, foi um tema muito apropriado às tradições da Vila Isabel, que iniciou seu desfile ao amanhecer, com seus cerca de 3000 figurantes. O samba, considerado um dos melhores do ano, tinha na segunda parte o seu melhor momento. Jorge Freitas foi o carnavalesco responsável pelo desfile. A comissão de frente, vestida como “Anunciantes da Folia”, apresentou corretamente a escola, pedindo passagem ao primeiro carro, denominado: “A Folia Irá Começar”. O sol, as máscaras tribais, os portugueses e as máscaras carnavalescas marcaram presença nas primeiras alas. Adorei o carro “Eterna Paixão”, cheio de palhaços, pierrôs e máscaras. As composições e o destaque central se harmonizaram muito bem com os tons de lilás e violeta predominantes na alegoria. Os carnavais de rua foram relembrados no carro “Folia Geral”, onde não faltaram os calhambeques do corso. O carro referente às grandes sociedades quebrou ainda na concentração, mas entrou na pista, graças ao esforço de várias pessoas que conseguiram fazer com que o carro desfilasse. “Viva o Zé Pereira” foi o nome de uma das alegorias que, como as outras, estava bonita, mas não muito criativa. As baianas, em tons de azul, se vestiram de “Rainhas do Samba”, mas não estavam muito elegantes, haja vista que o tamanho dos elementos que compunham a vestimenta não era muito adequado. Não entendi muito bem a crítica que a escola fez aos desfiles da Sapucaí no carro “Festa Profana, Show e Visual” e entendi menos ainda a presença de inúmeras pessoas com as famigeradas camisetas brancas (uma praga que teve seu auge na segunda metade dos anos 90 e que ainda não foi exterminada) à frente do último carro da Vila, que prestou uma homenagem aos baluartes do samba. Apesar do problema das camisetas, o desfile foi muito simpático, principalmente porque relembrou a ingenuidade dos tempos românticos.
Sete horas, mais trinta minutos da terça-feira de carnaval. Os últimos componentes da Vila deixavam a Apoteose, mas o clima de alegria ainda estava presente nas ruas do Rio e em todo o Brasil. Como acontece após qualquer desfile, as especulações eram muitas em torno das prováveis campeãs. Na minha opinião, a Viradouro fez o melhor desfile, mas a Mocidade também tinha muitas chances. As outras vinham num segundo plano e havia algumas possibilidades para a Imperatriz (principalmente), para a Mangueira e até mesmo para a Beija-Flor e a Porto da Pedra.
Ainda na terça-feira de carnaval, o Júri do Estandarte de Ouro conferiu à Viradouro o prêmio de melhor escola. Já a pesquisa feita com o povo que assistiu o desfile nas arquibancadas apontou a Mocidade como a melhor.
A apuração, realizada mais uma vez na quarta-feira de cinzas, começou com cinco escolas sendo punidas por infrações durante o desfile:
- Acadêmicos da Rocinha – Perdeu 3 pontos em obrigatoriedades;
- Império Serrano – Perdeu 3 pontos em obrigatoriedades (merchandising nas camisetas dos carregadores de adereços) e 1 ponto em dispersão;
- Grande Rio – Perdeu 1 ponto em dispersão;
Sete horas, mais trinta minutos da terça-feira de carnaval. Os últimos componentes da Vila deixavam a Apoteose, mas o clima de alegria ainda estava presente nas ruas do Rio e em todo o Brasil. Como acontece após qualquer desfile, as especulações eram muitas em torno das prováveis campeãs. Na minha opinião, a Viradouro fez o melhor desfile, mas a Mocidade também tinha muitas chances. As outras vinham num segundo plano e havia algumas possibilidades para a Imperatriz (principalmente), para a Mangueira e até mesmo para a Beija-Flor e a Porto da Pedra.
Ainda na terça-feira de carnaval, o Júri do Estandarte de Ouro conferiu à Viradouro o prêmio de melhor escola. Já a pesquisa feita com o povo que assistiu o desfile nas arquibancadas apontou a Mocidade como a melhor.
A apuração, realizada mais uma vez na quarta-feira de cinzas, começou com cinco escolas sendo punidas por infrações durante o desfile:
- Acadêmicos da Rocinha – Perdeu 3 pontos em obrigatoriedades;
- Império Serrano – Perdeu 3 pontos em obrigatoriedades (merchandising nas camisetas dos carregadores de adereços) e 1 ponto em dispersão;
- Grande Rio – Perdeu 1 ponto em dispersão;
- Santa Cruz – Perdeu 1 ponto em dispersão;
- Estácio de Sá – Perdeu 4 pontos em obrigatoriedades (1 por apresentar número inferior a 100 baianas e 3 por merchandising proibido).
- Estácio de Sá – Perdeu 4 pontos em obrigatoriedades (1 por apresentar número inferior a 100 baianas e 3 por merchandising proibido).
Anunciadas as punições, passaram a serem lidas, de imediato, as notas dos 36 julgadores: quatro para cada quesito. As notas do quesito Mestre-Sala e Porta-Bandeira, o primeiro na ordem de leitura, não causaram muita estranheza, até mesmo porque a nota 9 conferida ao casal da Mocidade já era até esperada, haja vista a indumentária inadequada do casal. É importante lembrar que de acordo com as regras pré-estabelecidas, a menor e a maior nota eram desconsideradas, portanto, a Mocidade conseguiu 20 pontos no quesito, já que os outros julgadores atribuíram nota máxima à escola. No quesito Comissão de Frente, causou algum espanto a nota do julgador Vitor Henrique atribuída a Estácio de Sá: 7,5 (um ponto a menos que o atribuído à escola que tivera, do mesmo julgador, a pior avaliação). No quesito Fantasias, apenas três escolas obtiveram notas máximas de todos os julgadores: Viradouro, Mocidade e Beija-Flor. A surpresa nesse quesito ficou por conta da julgadora Ana Ferrer, que tirou meio ponto da Imperatriz e meio ponto do Salgueiro, que estava muito inferior em figurinos em relação à escola de Rosa Magalhães. Mais uma vez, apenas três escolas obteriam notas máximas de todos os julgadores também no quesito Alegorias e Adereços: Imperatriz, Viradouro e Mocidade. Minha surpresa ficou por conta das notas dadas à Portela, que foram maiores que as atribuídas à União da Ilha, que teve um conjunto alegórico bem superior. No quesito Enredo, a julgadora Liana Toledo, no alto de sua extrema incompetência, não observou diferenças entre os enredos do Império Serrano e da União da Ilha e deu às duas escolas a nota 8,5. Quatro escolas obtiveram notas máximas de todos os julgadores de Enredo: Imperatriz, Viradouro, Mocidade e, pasmem, Beija-Flor. No quesito Evolução, as escolas Imperatriz Leopoldinense e Beija-Flor saíram da ponta, deixando a Mocidade e a Viradouro (única a receber notas dez dos quatro jurados) à frente. E foi no quesito Harmonia que a Viradouro consolidou o primeiro lugar, já que a Mocidade fora punida com duas notas 9,5. O único quesito no qual nenhuma escola obteve notas máximas de todos os jurados foi Samba-Enredo, penúltimo na ordem de apuração. Na leitura das notas do quesito Bateria as emoções foram à flor da pele, já que a Viradouro recebera nota 9 do terceiro julgador. Mas as esperanças do pessoal da Mocidade acabaram quando Jorge Perlingeiro leu a nota dez que sacramentou a vitória da escola de Niterói.
O resultado geral foi o seguinte:
1º - Unidos do Viradouro – 180 pontos
2º - Mocidade Independente – 179,5
3º - Estação Primeira de Mangueira – 178,5
4º - Beija-Flor de Nilópolis – 178
5º - Porto da Pedra – 177,5
6º - Imperatriz Leopoldinense – 177,5
7º - Salgueiro – 177
8º - Portela – 174,5
9º - Vila Isabel – 173,5
10º - Grande Rio – 169
11º - Unidos da Tijuca – 168
12º - União da Ilha – 166 (muito injustiçada, a meu ver)
13º - Estácio de Sá – 163
14º - Santa Cruz – 163
15º - Império Serrano – 162
16º - Rocinha – 153,5
Conforme o regulamento, as quatro últimas colocadas foram rebaixadas para o Grupo A, enquanto as cinco primeiras voltaram à passarela no Desfile das Campeãs.
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