domingo, 12 de fevereiro de 2012

Milton Cunha*: Branco pode, preto não!


Da Coluna Opinião do O Dia

O crioulo era doido porque era preto, se branco fosse seria artista conceitual, do universo do fantástico, do surreal, da quebra de fronteiras entre realidade e sonho. Imagina se alguém teria coragem de chamar um intelectual ariano de doido, só porque propõe a engraçadíssima mistureba de diversos personagens famosos que viveram em épocas distintas. Na minha opinião isto nada tem a ver com loucura, acho proposição coberta de deboche, perfeitamente dentro desta galhofa nacional que vejo no Brasil diariamente. E insisto que fácil è cobrar moralidade do crioulo, um degrau abaixo na escala de sapiência dos que se consideram sábios, ou acreditam em arte menor ou arte popular. Vindo da Europa é, no mínimo, quebra de paradigma.
 Falta hoje aos enredos de escola de samba um pouco de samba, de crioulo e de doidice. E sempre na Grande Rio o enredo é mais respeitado que no Porto da Pedra, escola menor na hierarquia do poder. Lembram daquele ano em que afirmei que Olorum mandou buscar na mata o biocombustível e os inteligentes caíram de pau na pobre Viradouro, e no ano anterior tinham adorado a afirmação de Nilópolis de que Deus tinha escolhido Macapá como o suprassumo do mundo? Seriam dois pesos e duas medidas? Bem faz o famoso Paulo Barros, que para homenagear Luiz Gonzaga, rei do Baião, realiza na Marquês do Sapucaí um entronamento cujos convidados são Michael Jackson, Dona Maria a Louca e Elvis Presley, mas acho que deve pintar um Darth Vader por aí, Paulo a-do-ra cinema americano. Ele esta certíssimo, às favas o mesmo sertão que já passou mil vezes, o crioulo tem mais é que enlouquecer mesmo. Que diferença faz a fantasmagoría de Ana Jansem em sua carruagem de fogo passar pelas ruas de Sao Luís do Maranhão, como uma caveira, na homenagem da Beija-Flor, e a via láctea ser considerada o primeiro indício de que a humanidade vê leite em tudo que é canto, na homenagem da Porto da Pedra? Vale Vale do Rio Doce na Grande Rio e não vale iogurte no Porto da Pedra? Rosa Magalhães pode misturar dinossauros, índios goytacazes e ‘O Guarany’ de Carlos Gomes na sua homenagem às terras de Campos e a pobre da Renascer de Jacarepaguá não pode insistir que Deus tocou o coração de Romero Brito? Por que as ricas podem sonhar e as pobrezinhas têm que estar para sempre amarradas aos ditames do real inteligente e branco? Por que só se pode criticar ou dar nota baixa para o sonhodas menos favorecidas, se o direito ao sonho é universal? Por que tentam aprisionar os enredos no cartesiano raciocínio científico? Reis da cocada preta, permitam que o crioulo, ainda que doido, reine soberano neste que deveria ser seu reino, os dias de suspensão do real, onde se divertir é a única coisa que importa.

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