Mais Vale um Jegue que me carregue, que um camelo que me derrube lá no Ceará é mais uma prova de que o samba pode e deve exercer sua função de instrumento de resgate de nossa cultura, cumpre assim a escola de samba o prazer de ensinar a história do Brasil e ninguém melhor que a Imperatriz para brindar o povo com uma passagem até então esquecida, ou melhor, deixada de lado pelos grandes compêndios, ave Rosa Magalhães.
Domingo de carnaval, 26 de fevereiro, desfilei ao lado de Zé Luiz, Neném, Isaac, Ari do Cavaco, Eli Penteado, entre tantas outras cabeças coroadas portelenses, foi um desfile à felicidade, um reencontro, um momento de catarse na praça da apoteose... Saímos da avenida direto à primeira barraca que encontramos a fim de brindar aquele dia.
Segunda feira, 27 de fevereiro, nesse dia resolvi ficar em casa, curar minha ressaca, fazer planos para a quarta de cinzas e ver os desfiles da noite. Estava tudo correndo como combinado quando chega a "sexta de segunda" na madrugada de terça feira, Preto Jóia parecia em estado de graça, Ronaldo Ylê e Braguinha em perfeita sintonia, isso eu percebi logo no esquenta da escola: a Rainha de Ramos ecoando como nunca, lindo, de arrepiar, mas esse foi apenas o começo de um desfile magnífico, que vinha para honrar os melhores anos desta grande escola. Anos de Arlindo Rodrigues, Max Lopes, Viriato Ferreira e agora Imperatriz de Rosa Magalhães em carros bem acabados, o estilo barroco em verdadeira comunhão com o carnaval.
O sono que a noite toda me chamava pra dançar nos seus braços e me levar pra cama aos poucos caiu no samba e cantou pra subir ao ver as sombrinhas em verde e dourado subindo e descendo, ora abertas, ora fechadas, quase sempre girando... Esse parece ser um dos mais marcantes trabalhos de Fabio de Melo nos longos anos de sucesso, que revolucionaram na década de 90 o quesito comissão de frente, na escola do subúrbio da Leopoldina. E o samba bonito, denso e marcante, muito mais do que se apresentava no período pré-carnavalesco, cumpriu com louvor a sua função, o auge foi ouvir as terceiras, da bateria de mestre Beto, recortando como se zabumbas fossem no refrão do meio: Balançou não deu certo não, pois não passou de ilusão...
Iludido, Balançando de um lado ao outro fui levado pelo encantamento e a preocupação ao ver uma alegoria mais requintada que a outra, sem falar nas fantasias: damas da corte, nobres do segundo império, mouros e sambistas. Foi um luxo ver Maria Helena e Chiquinho flutuarem pela passarela, harmonia correta, a certinha de Ramos fez escola, nessa época tinha em sua equipe muitos dos grandes diretores do quesito hoje em dia, olhos iluminados esqueci por algo mais de uma hora do meu sonho de ser feliz e viajei com a Imperatriz Leopoldinense em cada detalhe do seu carnaval até adormecer.
A terça feira gorda pareceu mais longa do que às 24 horas permitem, lenta, insossa, quase que cruel com a minha ansiedade pela quarta de cinzas, a quarta feira de apuração do grupo especial. Eis que no grande dia resolvi fazer diferente dos outros anos, não fiquei em casa acompanhando pela televisão, nem mesmo pensei em ir para Marques de Sapucaí, fui para Madureira, mais exatamente para o Portelão em busca do tão sonhado título, peguei uma cadeira na quadra lotada e fiquei do lado do palco, sozinho, fazendo as anotações na tabela de quesitos.
Foi um sofrimento sem fim, nota a nota uma disputa acirrada, comemoração por cada dez, lágrimas pelo meio ponto que insistia em faltar, é a conta não deu, não deu!
Sem querer comparar os desfiles posto entender que arte em sua maior essência não deva ser comparada e sim admirada, aprendeu nesse dia meu coração que tem mania de amor o porquê do canto tão emocionado dos sambistas de Ramos: Quem não sabe o que é o amor, não sabe o que é ser feliz, Quem não sabe o que é amar, não sabe o que é Imperatriz...
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