
Marquês
de Sapucaí, dia 10 de fevereiro de 1986, segunda de Carnaval. Um
festival de prata em plena pista, uma tempestade de luxo e bom gosto, a
Beija-Flor de Nilópolis fez tremer as arquibancadas da passarela do
samba com um desfile antológico e emocionante, remando e evoluindo por
uma avenida à prova d’água e de resistência. O enredo "O mundo é uma
bola" de autoria de Joãosinho Trinta navegou, literalmente, pela
invenção e história do futebol. Uma gigantesca bola asteca abriu o
desfile aproveitando o ano da Copa do Mundo. Fantasias e carros
alegóricos remetiam às imagens e símbolos futebolísticos. Alegorias e
passistas imergiram na chuva torrencial. O tema futebol quase se
transformou em pólo aquático.
O samba foi cantado a plenos pulmões pelos desfilantes, quase
escafandristas de um grande aquário que se tornou a Sapucaí. A
azul-e-branco da Baixada obteve 211 pontos e fez com que a escola
ficasse com o vice-campeonato do grupo Especial. Um desfile delirante e
(a)temporal para ficar na memória do Carnaval Carioca. Uma inundação de
garra e samba pelas canelas. A chuva lavou a alma da comunidade de
Nilópolis. A Beija-Flor sobrevoou a passarela debaixo d’água.

Naquela
noite um temporal assolou a segunda escola a desfilar. Lembro-me da
minha tia querendo ir embora. No alto da minha (in)significância de
adolescente falei que não iríamos, teríamos que esperar a próxima escola
a desfilar: a minha União da Ilha do Governador do irretocável Arlindo
Rodrigues! E não é que só choveu (e como choveu!) durante o desfile da
Beija-Flor?
Componentes misturaram à chuva o suor. Fantasias pesadas e
encharcadas dificultaram o desfilante de sambar. A chuva tornou a peleja
mais difícil, quase sem condição para uma boa atuação. O campo de jogo,
de ensopado e alagado, tornou-se um reservatório de euforia e canto
forte. Explosão de alegria. A água até a altura dos joelhos impulsionou a
enxurrada de emoção e garra dos componentes nilopolitanos. Que beleza a
Beija-Flor!
Era uma profusão de cores sensibilizando o visual dos torcedores e
sacudindo a galera. As bandeiras tremularam nas arquibancadas. Um golaço
de felicidade!

A
chuva típica de verão parou completamente quando a terceira escola
entrou na avenida. "Assombrações" era o enredo da Ilha. Seria
coincidência? Sim, a Beija-Flor tinha que desfilar sob um dilúvio e
assombrar a Sapucaí. Noé, na personificação do mundo do samba, aplaudiu
de pé. Eis a invenção do futebol, um sonho triunfal do artista
maranhense. J30, mais uma vez, deixava a sua marca nos desfiles das
Escolas de Samba. Dez, nota dez!
Nenhum comentário:
Postar um comentário