terça-feira, 29 de novembro de 2011

Sambas 2012: safra privilegiada



É comum se fazer uma análise precipitada e, até certo ponto, "fominha" dos sambas-enredo após o lançamento ou a divulgação das gravações originais. Muitas vezes esse juízo é pautado pela necessidade de opinar, mais do que efetivamente pela observação crítica mais coerente ou assertiva.

Com todo respeito aos analistas que se precipitam aos comentários de saída, de uns anos pra cá tenho procurado uma outra "metodologia" para expor minhas análises. Já me desgastei em experiências anteriores nas quais cometi injustiças ou causei indignações, visto que toda crítica é sempre muito subjetiva e as primeiras audições näo sao suficientes para se mensurar a qualidade desse tipo de composição.

Digo isso porque analisar samba-enredo é das tarefas mais complexas que há. Já começa que, além de se precisar conhecer o enredo para avaliar se a letra o desenvolve com propriedade, deve-se levar em conta fundamentos tais como a identidade da agremiação e a linha melódica de sua ala de compositores. Sim, as identidades das escolas podem fazer com que sambas consagrados em umas soassem como fiascos em outras. Além da necessidade desse conhecimento prévio (que, sinceramente, eu duvido que boa parte daqueles jurados empolados tenha), o samba-enredo é o único gênero musical pré-julgado sob um critério "causa-efeito": as pessoas ouvem e tentam antecipar se ele "vai empolgar", "vai conduzir a escola", vai "funcionar".

Pois é: samba-enredo deve ser o único gênero musical que precisa ser "funcional", além de poético, melódico, emotivo, original, adequado etc etc etc.

Pergunto eu: é fácil, assim, de tacada, se pronunciar sobre isso?

Este ano, porém, uma evidência pode diminuir esse espaço de tempo para uma avaliação mais adequada. É que o nível das composições parece estar muito mais elevado que a média de anos anteriores. Que extraordinários estão, por exemplo, os versos de Portela, Imperatriz, Beija-Flor (soberana no quesito "junção de sambas") e Vila Isabel! Para citar apenas os que me parecem "melhor aquinhoados" (citando o velho Rosa) por seus belos enredos. Todas as escolas vieram bem servidas, o que näo esconde uma necessidade cada vez maior de que as gravações oficiais sejam menos "estúdio" e mais "quadra". É chato avaliar o nível dos sambas pela"produçäo": preferimos produtores "invisíveis" e mais "alma de escola" nas gravações.

Como nada é por acaso, um pequeno grande detalhe está fazendo toda a diferença nesta safra 2012. Será um ano de grandes sambas porque as escolas estão trabalhando enredos de muita pertinência com suas tradições históricas, o que incrementou a inspiração de suas respectivas alas de compositores. Mocidade, Salgueiro, União da Ilha, São Clemente e Grande Rio esbanjam verdade e felicidade em seu canto. A caçula Renascer, com seu enredo "Brazilian Day" sobre o pintor Romero Brito, esbanja personalidade em sua estreia sob os holofotes principais. Porto da Pedra segue sua trilha de crescimento ano a ano. E a velha Mangueira, jequitibá do samba (a meu ver apostando num enredo muito mais próximo do subúrbio da Leopoldina ¬ portanto da Imperatriz - do que do Buraco Quente), também tem um belo samba para se aproximar desse tema.

A safra é realmente animadora. O samba-enredo está vivo, apesar de alguns criticos de ocasião continuarem depreciando as obras atuais comparando com as de antigamente a dizer que os sambas de hoje são esquecidos rapidamente.

Se a gente lembrar que a cultura de rádio, onde os sambas-enredo eram mais divulgados, perdeu terreno com o passar dos anos, e que a televisão compra o desfile e produz vinhetas milionárias onde os sambas são exibidos em clipes ridículos de 40 segundos, cortando pela metade até o primeiro refrão, dá pra entender por que sambas extraordinários caem no esquecimento enquanto pagodes cafonas e brega sertanejo nos sufocam nos capítulos de telenovela.

Enfim, "agoniza mas näo morre" essa arte extraordinária. Senão na mídia pasteurizada, nas quadras e nos celeiros onde estão os verdadeiros artistas e amantes dessa festa!

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