sexta-feira, 13 de maio de 2011

Na Passarela do Samba



O Carnaval de 2012 trará para os sambistas não só novos enredos, novos sambas, novos e velhos ídolos: ele é o mais esperado desde 1984, porque nosso espaço tradicional, conhecido oficialmente como Passarela do Samba Darcy Ribeiro, mas chamado carinhosamente de Sambódromo, está passando por uma grande reforma, cujos efeitos só conheceremos bem perto do Carnaval.
É claro que, como sambista, tenho uma expectativa positiva. Para falar a verdade, e com todo o respeito, o prédio da Brahma sempre foi uma pedra no nosso sapato bicolor.  E por quê? Porque impedia o vis-à-vis das arquibancadas, que desde sempre se revelou um fator de animação. Todo mundo se lembra do Carnaval de 1992: a vitória da Estácio de Sá com aquele Carnaval maravilhoso foi em parte atribuída à arquibancada do Setor 11, que, antes de virar setor de turistas, era o mais animado da Sapucaí. O setor 11 chegou inclusive a receber naquele ano um prêmio do hoje extinto Conselho do Carnaval, o Prêmio Cidade do Rio de Janeiro, por sua participação no resultado. 
E qual era o segredo da animação do Setor 11? Um dos segredos era o diálogo com o Setor 4, que lhe é fronteiro. O pobre Setor 4, cujas arquibancadas ficam em recuo em relação à pista, só permitindo que o espectador veja alguma coisa quando a escola desfilante já está bem na sua frente, era contagiado pela animação do 11, as brincadeiras e coreografias se sucediam, coisa que não se pode esperar dos camarotes fronteiros aos demais setores ímpares, porque muitas vezes temos a sensação de que no camarote há muita coisa pra fazer além de assistir ao desfile. Lá a animação é uma exceção.
A mudança anunciada me fez lembrar o longínquo 84, em que após sonhos e expectativas nos deparamos com um espaço inadequado ao desfile. Com o tempo foram feitos acertos, mas num primeiro momento exigiu-se das escolas de samba uma performance na Praça da Apoteose que nunca fez parte de suas tradições.  E até que se dessem conta do absurdo de uma exigência que descaracterizava brutalmente o desfile, as escolas se esforçaram para dar razão de ser àquilo. E raramente conseguiram.
Para mim sempre ficou uma dúvida: os sambistas não foram ouvidos? As entidades representativas não foram consultadas? E é isso que me aflige agora: inicia-se uma reforma há muito esperada, mas sem consulta a quem realmente conhece aquele espaço. Mesmo que as ligas e associações tenham sido ouvidas, para mim existe uma certeza: quem entende de arquibancada é Dona Celuta, uma senhora que conhecemos nas filas de entrada do Setor 11 e que disputava com o meu grupo ser a primeira a entrar na arquibancada para pegar o espaço da "quina", bem em cima do recuo da bateria. Com chuva ou com sol, Dona Celuta esteve no Sambódromo a cada ano, conhece cada espaço e cada problema.
Como ela, devem existir muitas outras pessoas. E eu pergunto: Dona Celuta foi ouvida? Assim como nela simbolizo o fiel amante do carnaval das escolas de samba, vou mais longe: será que Henrique Matos foi ouvido? O querido fotógrafo do espetáculo está aqui simbolizando todos aqueles que trabalham no espaço da passarela: fotógrafos, repórteres de diversos meios de comunicação, etc. A reforma mudará muito a vida dessas pessoas. Elas certamente teriam muito a dizer sobre isso. Mas sinceramente, não ouvi dizer que ninguém tenha sido consultado.
O assunto é tão apaixonante que terei de voltar a ele mais adiante, porque muita coisa ficou por dizer. Mas a reflexão que se impõe por enquanto é: por que errar para depois consertar? Não seria menos desgastante e mais econômico fazer logo tudo direito?
Para concluir, aí vai o refrão do bom samba da campeã de 1992:
"Modernismo movimento cultural
No país da Tropicália
Tudo acaba em carnaval..."

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